Voltar Proteger mulheres, educar crianças e reeducar agressor: três frentes de luta da Cevid

"Não sou machista, eu deixo a minha mulher se vestir do jeito que ela quiser." Entreouvida num restaurante de Florianópolis, a frase revela um machismo arraigado que, muitas vezes, nem é percebido como tal. O autor da frase tem no máximo 30 anos e ele, infelizmente, não é exceção. Homens jovens, de acordo com pesquisa realizada pelo Data Popular em parceria com o Instituto Avon, acreditam que há justificativa para a violência e que as mulheres devem obedecê-los.

Como mudar esse tipo de pensamento e como lidar com as diferentes formas de violência doméstica?  Grande parte dos especialistas no tema concorda que a punição dos agressores, embora necessária e importante, é insuficiente. Por isso, a Coordenadoria da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar (Cevid), do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, em parceria com a Universidade Federal de Santa Catarina, implementou o projeto Ágora, focado na reeducação e conscientização do agressor. São grupos reflexivos nos quais os homens repensam seus papéis de gênero e suas relações cotidianas. Entre os resultados alcançados estão a responsabilização, a prevenção e a desnaturalização existente entre masculinidade e violência, além da criação de uma rede de atendimento para essas pessoas.

De acordo com o catarinense João Salm, professor de Direito Criminal em Chicago, essas iniciativas são mais eficientes do que as políticas simplesmente punitivas. "Elas permitem, entre outras coisas, que tanto o agressor quanto a vítima compreendam por várias lentes a cultura do machismo, raiz da violência". Os números comprovam a tese do professor Salm. No Estado de São Paulo, programas focados no agressor são previstos em lei e, em apenas dois anos, os casos de reincidência da violência doméstica caíram de 65% para 2%. Uma experiência em Jundiaí com 259 homens enquadrados na Lei Maria da Penha mostrou que em oito meses não houve nenhum caso de reincidência. 

Além da reeducação dos agressores, especialistas ressaltam a importância de educar as crianças para uma cultura de igualdade e de paz. Em 2015, a Cevid lançou o concurso "Dê um Basta na Violência", com a participação dos alunos do ensino fundamental e médio das escolas públicas e privadas da Grande Florianópolis. A partir desta iniciativa surgiu o "Formar para Transformar", um esforço permanente de capacitação de professores e diretores das escolas públicas para lidar com a temática da violência doméstica junto aos alunos em sala de aula. O projeto é realizado em parceria com as secretarias de educação estadual e municipais.  

Em outubro de 2019, em parceria com a Academia Judicial, a Cevid promoveu o 1º Seminário Estadual de Enfrentamento da Violência contra a Mulher, e as quase 500 vagas foram preenchidas com um mês de antecedência. Paralelamente ao seminário, foi realizada a 1ª Mostra de Pesquisa sobre Violências contra as Mulheres - Mostra VCAM - com a participação de outras 520 pessoas. Esse sucesso de público traduz o interesse crescente de servidores e magistrados catarinenses no tema. Para se ter uma ideia, o TJ ofereceu três edições de um curso virtual sobre feminicídio e questões de gênero.  Ao todo, participaram 1.632 pessoas - destas, quase metade era formada por homens.

Outro projeto recente da coordenadoria é o "Troca de Ideias", voltado exclusivamente ao público masculino do Judiciário, com rodas de conversa sobre os problemas da vida cotidiana. "A Justiça catarinense, há anos, desenvolve ações e firma parcerias com diversos órgãos no intuito de diminuir a violência doméstica em Santa Catarina", afirma Michelle de Souza Gomes Hugill, secretária da Cevid. "São programas, cursos, convênios, seminários, termos de cooperação técnica e produção de fôlderes e cartilhas no formato digital e impresso", completa. Além dessas iniciativas, diversas comarcas do Estado têm implementado programas e ações de combate à violência doméstica. Proteger as mulheres, educar as crianças e reeducar o agressor são, em resumo, as três principais frentes de luta da coordenadoria.

"Todas essas iniciativas", explica a desembargadora Salete Sommariva, "surgem da necessidade de aprimorar, cada vez mais, o enfrentamento das inúmeras formas de violência praticadas contra as mulheres". A magistrada catarinense está à frente da Cevid e também do Colégio de Coordenadores da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Poder Judiciário Brasileiro (Cocevid).

Imagens: Divulgação/Freepik
Conteúdo: Assessoria de Imprensa/NCI
Responsável: Ângelo Medeiros - Reg. Prof.: SC00445(JP)

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