Pedido de Uniformização de Jurisprudência em Agravo de Instrumento n. 2012.018275-6/0001.00, de São José

Relator Designado: Des. Joel Dias Figueira Júnior

PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. PERÍCIA REQUERIDA POR AMBAS AS PARTES. RELAÇÃO DE CONSUMO. POSSIBILIDADE DE INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. AUTOR BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. PAGAMENTO ANTECIPADO DE METADE DOS HONORÁRIOS PERICIAIS PELA PARTE DEMANDADA.

Conforme disposição do art. 33, caput, do Código de Processo Civil, "cada parte pagará a remuneração do assistente técnico que houver indicado; a do perito será paga pela parte que houver requerido o exame, ou pelo autor, quando requerido por ambas as partes ou determinado de ofício pelo juiz".

Ressalta-se que o fato de o litígio versar sobre relação de consumo - com a possibilidade, portanto, de inversão do ônus da prova (art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor) - não tem o condão de, por si só, obrigar o fornecedor ou prestador de serviço a arcar com as despesas oriundas da realização das provas requeridas pela parte contrária.

No entanto, considerando as peculiaridades decorrentes do fato de seu o autor beneficiário da justiça gratuita, faz-se necessária uma interpretação teleológica, axiológica e sistemática das normas relativas ao ônus da prova, em especial quanto aos art. 19, 33 e 333 do Código de Processo Civil.

Dessa feita, em atenção aos fins sociais do processo e ao princípio da equidade, nas demandas em que se verifica a existência de relação de consumo, sendo o demandante beneficiário da justiça gratuita, deve o réu arcar com o pagamento prévio de metade do valor dos honorários periciais nas hipóteses em que a produção da prova técnica for requerida por ambos os litigantes ou exclusivamente pelo autor, ou, ainda, determinada de ofício pelo juiz.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Pedido de Uniformização de Jurisprudência em Agravo de Instrumento n. 2012.018275-6/0001.00, da comarca de São José (1ª Vara Cível), em que é suscitante a Egrégia Sexta Câmara de Direito Civil:

O Grupo de Câmaras de Direito Civil decidiu, por maioria de votos, firmar o entendimento de que deverá a Ré/Agravada arcar antecipadamente com 50% do valor atinente à produção da prova pericial. Vencidos os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Jaime Luiz Vicari, João Batista Góes Ulysséa, Ronei Danielli e Jairo Fernandes Gonçalves. Custas legais.

O julgamento, realizado em 12 de junho de 2013, foi presidido pelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Trindade dos Santos, com voto, e dele participaram os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Jaime Luiz Vicari, Maria do Rocio Luz Santa Ritta, Henry Petry Junior, Victor Ferreira, Luiz Fernando Boller, Jairo Fernandes Gonçalves, Raulino Jacó Brüning, Ronei Danielli, João Batista Góes Ulysséa, Denise de Souza Luiz Franconski, Saul Steil e Odson Cardoso Filho.

Funcionou como representante do Ministério Público o Excelentíssimo Senhor Procurador de Justiça Mário Gemin.

Florianópolis, 13 de agosto de 2013.

Joel Dias Figueira Júnior

RELATOR

 

RELATÓRIO

A Sexta Câmara de Direito Civil, em acórdão da lavra do Desembargador Jaime Luiz Vicari, suscitou incidente de uniformização de jurisprudência para este Grupo de Câmaras a fim de compor divergência existente entre as Câmaras isoladas acerca da possibilidade ou não do adiantamento da importância atinente ao pagamento de honorários periciais pela ré nos casos em que o autor seja beneficiário da justiça gratuita (fls. 69-72) e, por conseguinte, sumulada a tese vencedora desde que tomada a decisão por maioria dos membros que integram o Grupo (art. 479, caput, do Código de Processo Civil).

O Ministério Público, em parecer do Procurador de Justiça Paulo Ricardo da Silva, opinou pelo conhecimento do incidente e pela adoção do entendimento de que, na aludida hipótese, deve o réu ser intimado para efetuar o pagamento dos valores da perícia, sem que seja, entretanto, obrigado a fazê-lo, mas sim apenas advertido de que a não produção da prova implicará no reconhecimento da procedência do pedido do autor em face do reconhecimento implícito da veracidade dos fatos alegados (fls. 78-84).

É o relatório.

 

VOTO

Trata-se de incidente de uniformização de jurisprudência em que se discute acerca da possibilidade de adiantamento da importância atinente ao pagamento de honorários periciais pela parte ré nos casos em que a prova tenha sido requerida por autor beneficiário da justiça gratuita.

Dispõe o art. 33, caput, do Código de Processo Civil:

Art. 33. Cada parte pagará a remuneração do assistente técnico que houver indicado; a do perito será paga pela parte que houver requerido o exame, ou pelo autor, quando requerido por ambas as partes ou determinado de ofício pelo juiz.

Ressalta-se, pois, que o fato de o litígio versar sobre relação de consumo - com a possibilidade, portanto, de inversão do ônus da prova (art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor) - não tem o condão de, por si só, obrigar o fornecedor ou prestador de serviço a arcar com as despesas oriundas da realização das provas requeridas pela parte contrária.

Desse modo, se a produção prova técnica é requerida por ambos os litigantes ou exclusivamente pelo autor, ou, ainda, determinada de ofício pelo juiz, haveria de ser aplicada, em tese, a regra geral acima mencionada.

No entanto, as peculiaridades existentes no caso concreto não podem ser desconsideradas, tendo-se em conta que o Autor/Agravado é beneficiário da justiça gratuita, o que requer uma interpretação da norma legal em exame de acordo com os seus fins sociais e o princípio da equidade em face da impossibilidade de o demandante arcar com o custo para a produção da prova requerida.

Aliás, a própria Lei Instrumental faz essa ressalva, in verbis:

Art. 19. Salvo as disposições concernentes à justiça gratuita, cabe às partes prover as despesas dos atos que realizam ou requerem no processo, antecipando-lhes o pagamento desde o início até sentença final; e bem ainda, na execução, até a plena satisfação do direito declarado pela sentença (original não sublinhado).

Por outro lado, sabe-se que exigir do perito a realização de trabalho gratuito representa inadmissível desprestígio ao elevado munus por ele exercido, sem contar com a circunstância de que o profissional não está obrigado a prestar seus serviços sem perceber, ao menos em parte, seus honorários como forma de contraprestação.

Ademais, caso prevalecesse entendimento inverso, ficariam os autores, consumidores via de regra hipossuficientes, sem condições de fazer a prova do fato constitutivo do seu direito, pois, dependendo do objeto litigioso, a prova técnica é o único ou o principal meio de prova que pode ser manejada pelo jurisdicionado na defesa de seus direitos.

Diante de tais circunstâncias, faz-se necessária uma interpretação teleológica, axiológica e sistemática das normas relativas ao ônus da prova, em especial quanto aos art. 19, 33 e 333 do Código de Processo Civil.

Por essas razões, de modo a garantir o acesso à justiça e a facilitação dos direitos do consumidor (art. 6º, VII e VIII, da Lei n. 8.078/1990), sendo o demandante beneficiário da justiça gratuita, deve o réu arcar com o pagamento prévio de metade do valor dos honorários periciais nas hipóteses em que a produção da prova técnica for requerida por ambos os litigantes ou exclusivamente pelo autor, ou, ainda, determinada de ofício pelo juiz.

Firmado esse entendimento pelo Grupo de Câmaras, devem os autos ser devolvidos à órgão suscitante (Sexta Câmara de Direito Civil), para julgamento do presente Agravo de Instrumento, não sem antes tomadas as providências referidas no art. 158, § 3º, do Regimento Interno desta Corte.

É o voto.

Declaração de voto vencido do Excelentíssimo Senhor Desembargador Jaime Luiz Vicari

Trata-se de incidente de uniformização de jurisprudência versando acerca da incumbência de adiantamento dos honorários periciais nos casos em que ambos os litigantes pleiteam a produção de prova pericial mas uma das partes é beneficiária de Assistência Judiciária Gratuita ou Justiça Gratuita, operada a chamada inversão do ônus da prova, ante a existência de celeuma jurisprudencial constatada.

De acordo com precedentes da Primeira, Segunda, Terceira, Quarta e Quinta Câmaras de Direito Civil desta Corte de Justiça, respectivamente, o adiantamento dos honorários periciais deveria ser suportado na proporção de 50% pela seguradora, verbis:

SEGURO HABITACIONAL. AGRAVO RETIDO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. PRESUNÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA. A PRODUÇÃO DA PROVA PERICIAL PASSA A SER DE INTERESSE DO FORNECEDOR. ADIANTAMENTO DOS HONORÁRIOS PERICIAIS CABE À PARTE QUE REQUEREU A PERÍCIA. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 33 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. PROVA PERICIAL REQUERIDA POR AMBAS AS PARTES. AUTOR BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. ADIANTAMENTO PELA RÉ NO VALOR DE 50% DA PERÍCIA. POSSIBILIDADE.

A aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, com a consequente inversão do ônus da prova, não altera a regra do art. 33, do Código de Processo Civil, que atribui ao autor o dever de pagamento dos honorários periciais, quando a perícia for requerida por ele mesmo, por ambas as partes ou determinado de ofício pelo juiz. No entanto, uma vez declarada a inversão do ônus da prova, o interesse na produção da prova pericial passa a ser do fornecedor, tornando-se imprescindível a sua realização, tanto para a própria defesa da agravante, como para a verificação, mensuração, origem dos danos no imóvel e fixação de eventual indenização. "Requerida por ambas as partes a produção da prova pericial, e sendo o autor beneficiário da gratuidade de justiça, é possível impor à ré que antecipe o valor dos dispêndios com a realização da prova, limitado, contudo, a 50% do custo total, devendo o restante ser pago a final pelo vencido ou pelo Estado, caso sucumbente o beneficiário da gratuidade." (AI n. 2007.006593-5, de Fraiburgo, Rel. Desª. Maria do Rocio Luz Santa Ritta, DJE de 22-5-2007) (TJSC, Apelação Cível n. 2009.072312-9, de Lages, rel. Des. Carlos Prudêncio , j. 25-10-2011 - original sem realce).

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA AJUIZADA CONTRA A CAIXA SEGURADORA. PERÍCIA REQUERIDA POR AMBAS AS PARTES. AUTORES BENEFICIÁRIOS DA JUSTIÇA GRATUITA. ADIANTAMENTO DE METADE DAS CUSTAS PERICIAIS PELA DEMANDADA. VIABILIZAÇÃO DA PROVA E EFETIVIDADE DO PROCESSO, SOB PENA DE PRESUNÇÃO DE VERACIDADE DOS FATOS NARRADOS PELOS CONSUMIDORES. RECURSO DESPROVIDO.

A inversão do ônus da prova não gera a obrigação de antecipação dos honorários periciais pelo demandado, mas acarreta a presunção de veracidade dos fatos alegados pelo consumidor e não provados nos autos por falta da realização da prova requerida por ambas as partes. Contudo, em prol da viabilização da prova e da efetividade do processo, mostra-se razoável o adiantamento de metade das despesas periciais pela ré se o autor é beneficiário da justiça gratuita e ambas as partes requerem a produção da prova. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 2010.068471-1, de Itajaí, rel. Des. Luiz Carlos Freyesleben , j. 28-4-2011 - original sem realce)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESPONSABILIDADE OBRIGACIONAL SECURITÁRIA. SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO. SEGURO HABITACIONAL. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PROVA PERICIAL. ADIANTAMENTO DOS HONORÁRIOS DO PERITO. AUTORA BENEFICIÁRIA DA JUSTIÇA GRATUITA. RECURSO DESPROVIDO.

Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor às relações entre seguradora e segurado. "Segundo entendimento deste Tribunal, sendo o autor beneficiário da justiça gratuita e a prova pericial requerida por ambos os litigantes, portanto de interesse comum, deve o adverso do hipossuficiente arcar com metade do adiantamento dos honorários do expert, com consequente abrandamento do rigor legal do art. 33 do CPC, a fim de viabilizar a produção da prova" (TJSC, AI n. 2011.023838-0, de São Bento do Sul, rel. Des. Henry Petry Junior, j. em 10-1-2012). (Agravo de Instrumento n. 2012.020873-7, de São José, rel. Des. Fernando Carioni, j. em 4-9-2012 - original sem realce).

AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE RESPONSABILIDADE OBRIGACIONAL SECURITÁRIA - SEGURO HABITACIONAL - DECISÃO ATACADA QUE IMPÔS À SEGURADORA REQUERIDA/AGRAVANTE A RESPONSABILIDADE PELO ADIANTAMENTO DOS HONORÁRIOS DEVIDOS AO EXPERT - PERÍCIA REQUERIDA POR AMBAS AS PARTES - AUTORA BENEFICIÁRIA DA JUSTIÇA GRATUITA - EVIDENTE INTERESSE DA AGRAVANTE NA REALIZAÇÃO DA PROVA PERICIAL COM O FIM DE REVERTER A PRESUNÇÃO GERADA PELA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA EM FAVOR DA CONSUMIDORA - ADIANTAMENTO PELA SEGURADORA REQUERIDA QUE VISA FACILITAR A REALIZAÇÃO DA DILIGÊNCIA TÉCNICA - ACERTO DA DECISÃO VERGASTADA - HONORÁRIOS DO EXPERT FIXADOS EM R$ 3.000,00 (TRÊS MIL REAIS) - INSURGÊNCIA DA SEGURADORA REQUERIDA, QUE ALEGA EXCESSO NO VALOR FIXADO, DESTACANDO A NECESSIDADE DE REDUÇÃO DOS HONORÁRIOS PERICIAIS - INSUBSISTÊNCIA DA TESE - OBSERVÂNCIA DOS PARÂMETROS DO ART. 7º DO REGIMENTO DE CUSTAS E EMOLUMENTOS DO ESTADO DE SANTA CATARINA (LC Nº 156/97) - VERBA ADEQUADA AO TRABALHO A SER DESENVOLVIDO - DECISÃO ACERTADA - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 2010.081771-2, de São José, rel. Des. Luiz Fernando Boller , j. 1º-9-2011 - original sem realce)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CONDENATÓRIA. RESPONSABILIDADE CONTRATUAL SECURITÁRIA. PROVA TÉCNICA. HONORÁRIOS. INTERLOCUTÓRIO DETERMINANDO O RECOLHIMENTO INTEGRAL PELA RÉ. - POSTULAÇÃO COMUM. RATEIO. AUTORA COM GRATUIDADE. ISENÇÃO. ADIANTAMENTO DA OUTRA METADE. ÔNUS DA ACIONADA. - HONORÁRIOS. PRETENDIDA MINORAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. VERBA RAZOÁVEL. AUSÊNCIA DE PECULIARIDADES A RECOMENDAR A REDUÇÃO. - DECISÃO REFORMADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

- Se, de um lado, impossível obrigar o beneficiário da justiça gratuita a recolher qualquer despesa processual, também despropositado forçar a agravante a adiantar a totalidade dos honorários periciais, senão à exata medida de seu requerimento e interesse na produção da prova. Requerida a perícia pelas partes, razoável que a agravante deposite a metade do que couber ao expert.

- Em ações do gênero, assentou esta Casa, regra geral, o valor dos honorários periciais em R$ 2.000,00 (dois mil reais) por unidade habitacional, tal como fixado in casu, parâmetro mitigado se presentes particularidades a indicar a facilitação no labor do expert, notadamente quanto ao número de unidades a serem vistoriadas e se situadas no mesmo loteamento. Na ausência, contudo, de referidas peculiaridades, não há falar em minoração da verba arbitrada. (TJSC, Agravo de Instrumento n. 2012.028399-3, de São José, rel. Des. Henry Petry Junior , j. 13-9-2012 - original sem realce)

De outra banda, existem precedentes da Sexta Câmara de Direito Civil e do Superior Tribunal de Justiça, por meio dos quais é atribuído o encargo de adiantar os honorários periciais à parte autora, quando requerida a produção da prova técnica por ambas as partes, mesmo beneficiária de gratuidade e invertidos os ônus da prova, em respeito ao disposto no artigo 33 do Código de Processo Civil.

Destaca-se da Jurisprudência:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESPONSABILIDADE OBRIGACIONAL SECURITÁRIA. SFH. PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE ATIVA, INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL, FALTA DE INTERESSE DE AGIR E PRESCRIÇÃO AFASTADOS. ILEGITIMIDADE ATIVA DE UMA DAS AUTORAS, QUE NÃO COMPROVOU O FINANCIAMENTO DO IMÓVEL E, PORTANTO, QUE O BEM FORA SEGURADO. ÔNUS QUE LHE INCUMBIA POR SER FATO CONSTITUTIVO DE SEU DIREITO, A TEOR DO ARTIGO 333, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. HONORÁRIOS PERICIAIS. OBRIGATORIEDADE DE ADIANTAMENTO PELA SEGURADORA AFASTADA. PROVA REQUERIDA TANTO PELOS AUTORES QUANTO PELA RÉ, INCIDÊNCIA DA REGRA DO ARTIGO 33 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO (TJSC, Agravo de Instrumento n. 2012.039636-2, de Fraiburgo, rel. Des. Ronei Danielli, j. 06-12-2012 - original sem realce).

E ainda:

PROCESSO CIVIL. PROVA. FATOS CONSTITUTIVOS DO DIREITO. ÔNUS DO AUTOR. RESPONSABILIDADE PELA ANTECIPAÇÃO DOS HONORÁRIOS PERICIAIS. INDIFERENÇA. DEVER DE LEALDADE E BOA-FÉ.

1. Ainda que o dever de arcar com a antecipação dos honorários periciais seja do réu - por ser o autor beneficiário da assistência judiciária gratuita -, é do autor o ônus de provar os fatos constitutivos do seu direito, de sorte que não poderia, de nenhuma forma, ainda que por omissão, contribuir com a não realização da perícia médica para, futuramente, se beneficiar de sua própria desídia. Esse comportamento ofende os deveres de lealdade e boa-fé processual que, de acordo com o art. 14, II, do CPC, devem permear toda e qualquer participação em ação judicial.

2. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido (REsp 1143016/ES, relatora Ministra Nancy Andrighi, j. em 15-12-2011 - original sem realce).

Pois bem e com o devido acatamento, há de prevalecer este último entendimento.

Isso porque, a chamada inversão do ônus da prova nos casos em que incide o Código de Defesa do Consumidor não significa inversão do ônus financeiro de adiantar os honorários, por manifesta inexistência de previsão legal.

A solução arbitrada até poderá ser cômoda mas inegavelmente não se afigura legal.

A dicção do artigo 33 do Código de Processo Civil soa clara e, pensa-se, in claris cessat interpretatio:

Art. 33. Cada parte pagará a remuneração do assistente técnico que houver indicado; a do perito será paga pela parte que houver requerido o exame, ou pelo autor, quando requerido por ambas as partes ou determinado de ofício pelo juiz.

Parágrafo único. O juiz poderá determinar que a parte responsável pelo pagamento dos honorários do perito deposite em juízo o valor correspondente a essa remuneração. O numerário, recolhido em depósito bancário à ordem do juízo e com correção monetária, será entregue ao perito após a apresentação do laudo, facultada a sua liberação parcial, quando necessária.

A situação fática posta em discussão ocorre quando ambas as partes pleiteam a produção de prova pericial e a parte autora, por ser beneficiária da justiça gratuita ou da assistência judiciária gratuita, está dispensada de adiantar o pagamento dos honorários periciais.

Nesse sentido, dispõe o artigo 19 do Código de Processo Civil:

Art. 19. Salvo as disposições concernentes à justiça gratuita, cabe às partes prover as despesas dos atos que realizam ou requerem no processo, antecipando-lhes o pagamento desde o início até sentença final; e bem ainda, na execução, até a plena satisfação do direito declarado pela sentença.

Frente a essas circunstâncias e às disposições expressas da legislação processual, por mais que se compreendam as razões político-processuais pelas quais se determina que a ré adiante os honorários periciais, com as vênias de estilo essa medida ofende o princípio da legalidade estrita por inexistência de previsão legal dessa inversão e, por consequência, afasta-se do princípio da segurança jurídica, ambos diretrizes centrais do Estado Democrático de Direito, como prescreve o artigo 1º da Constituição Federal.

Além disso, vale ponderar que a lógica do sistema processual impõe ao autor a alegação de fatos constitutivos de seu direito e, sobretudo, a sua comprovação, cabendo ao réu, tão somente, obstaculizar, quando for o caso, tal pretensão. Jamais se poderia impor ao réu o dever de comprovar o fato constitutivo do direito do autor, sob pena de subversão do âmago processual.

Sobre o ônus da prova, ensina Ovídio A. Baptista da Silva:

O autor só poderá dar consistência objetiva à sua pretensão em juízo fazendo afirmações sobre a existência de fatos e a pertinência deles a uma relação jurídica. Enquanto ele afirma, deve naturalmente provar as afirmações que faz. Assim também o réu se, ao defender-se, tiver necessidade de fazer afirmações em sentido contrário. O réu poderá, certamente, limitar-se a negar os fatos afirmados pelo autor e esperar que este tente demonstrar a sua veracidade. Se o réu limitar-se a simples negativa, sem afirmar a existência de outros fatos incompatíveis com aqueles afirmados pelo autor, nenhum ônus de prova lhe gravará; se, todavia, também ele afirma fatos tendentes a invalidar os fatos afirmados pelo autor, caber-lhe-á o ônus de provar os fatos afirmados (Teoria Geral do Processo, RT, 2002, 3ª ed. p. 300).

Dessa forma, a excepcional inversão do ônus da prova admitida no Código de Defesa do Consumidor, nas hipóteses do seu artigo 6º, inciso VIII, jamais poderá acarretar na imposição ao réu da comprovação dos fatos que competem ao autor, senão o ônus de comprovar fato impeditivo, modificativo ou extintivo da pretensão formulada.

Preleciona Theodoro Júnior:

Não há um dever de provar, nem à parte contrária assiste o direito de exigir a prova do adversário. Há um simples ônus, de modo que o litigante assume o risco de perder a causa se não provar os fatos alegados e do qual depende a existência do direito subjetivo que pretende resguardar através da tutela jurisdicional. Isto porque, segundo a máxima antiga, fato alegado e não provado é o mesmo que fato inexistente (Curso de direito processual civil, Forense, 1999, 26ª ed., v. 1, p. 423).

Nessa linha de raciocínio, no caso específico envolvendo seguro habitacional, diante da inversão do ônus da prova em favor do consumidor, caberá à seguradora, e apenas a ela, comprovar algum fato que obste a pretensão do autor, a exemplo da inexistência de alegado vício construtivo. Do contrário, ela sofrerá - e, com o perdão pela repetição, apenas ela - as consequências da não produção da prova, presumindo-se verdadeiros os fatos alegados na petição inicial.

Daí a importância da distinção entre ônus e obrigação, como bem delineia, a respeito da matéria, Cândido Rangel Dinamarco:

Ônus são imperativos do próprio interesse e a consequência do descumprimento é a não-obtenção de uma vantagem ou recebimento de uma desvantagem. A parte que não cumpre os ônus de adiantamento de despesas sofre consequência consistente na ineficácia de seu ato ou em não obter a realização do ato que requereu. Ônus não se confunde com obrigação, porque esta é instituída em favor de outra pessoa, definindo-se como situação jurídica do obrigado em face do credor, em relação a um bem da vida. A parte que não faz os adiantamentos impostos por lei não se considera obrigada perante quem quer que seja, nem tem um credor por esses valores, nem o pagamento pode ser exigido. Simplesmente, sofre a consequência processual de sua omissão.

Ao ônus de adiantar honorários provisórios do perito corresponde a sanção consistente em não se realizar a perícia em caso de descumprimento, embora o art. 33 do Código de Processo Civil não seja explícito quanto a essa consequência (Instituições de direito processual civil. v. II. 5 ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 639 e 642).

Inúmeros precedentes do Superior Tribunal de Justiça, na função de uniformizar a interpretação da legislação federal, vedam a interpretação extensiva que admite a inversão do ônus de arcar com os honorários periciais como decorrência da inversão do ônus da prova.

Nesse sentido, destacam-se:

PROCESSUAL CIVIL. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. ARTS. 3º, V, E 11 DA LEI 1.060/50, 19 E 33 DO CPC. HONORÁRIOS PERICIAIS. ANTECIPAÇÃO PELO ESTADO, QUANDO O EXAME FOR REQUERIDO POR BENEFICIÁRIO DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA. DESCABIMENTO. REALIZAÇÃO DA PERÍCIA.

RESPONSABILIDADE DO ESTADO EM COLABORAÇÃO COM O PODER JUDICIÁRIO.

1. A controvérsia posta em debate diz respeito ao ônus pela antecipação dos honorários do perito em ação em que o autor da demanda, postulante da perícia, é beneficiário da justiça gratuita.

2. O fato de o beneficiário da justiça gratuita não ostentar, momentaneamente, capacidade econômica de arcar com o adiantamento das despesas da perícia por ele requerida, não autoriza, por si só, a inversão do ônus de seu pagamento.

3. Tendo em vista que o perito nomeado não é obrigado a realizar o seu trabalho gratuitamente, incumbe ao magistrado requisitar ao Estado, a quem foi conferido o dever constitucional de prestar assistência judiciária aos hipossuficientes, o ônus de promover a realização da prova técnica, por meio de profissional de estabelecimento oficial especializado ou de repartição administrativa do ente público responsável pelo custeio da produção da prova, o que deve ocorrer em colaboração com o Poder Judiciário (STJ, REsp 1245684/MG, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, julgado em 13-9-2011, original sem realce).

PROCESSUAL. ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. ANTECIPAÇÃO DOS HONORÁRIOS PERICIAIS. JUSTIÇA GRATUITA. EXPROPRIADO BENEFICIADO. INADEQUAÇÃO DA IMPUTAÇÃO DO ÔNUS AO EXPROPRIANTE.

1. O beneficiário da justiça gratuita, nos termos do art. 3º, inciso V, da Lei n.º 1.060/50, não está obrigado a arcar com as despesas relativas aos honorários periciais, ainda que a prova técnica tenha sido por ele requerida, consoante a exceção à regra prevista na primeira parte do art. 19, do CPC (Salvo as disposições concernentes à justiça gratuita, cabe às partes prover as despesas dos atos que realizam ou requerem no processo, antecipando-lhes o pagamento desde o início até sentença final; e bem ainda, na execução, até a plena satisfação do direito declarado pela sentença.).

2. O fato de o beneficiário da justiça gratuita não ostentar o poder de arcar com o adiantamento das despesas, não autoriza o juízo a inverter o ônus de seu pagamento (STJ, REsp 1116139/MG, Rel. Ministro Luiz Fux, julgado em 3-9-2009 - original sem realce)

PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DANO AMBIENTAL - ADIANTAMENTO DE HONORÁRIOS PERICIAIS PELO PARQUET - MATÉRIA PREJUDICADA - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - ART. 6º, VIII, DA LEI 8.078/1990 C/C O ART. 21 DA LEI 7.347/1985 - PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO.

1. Fica prejudicada o recurso especial fundado na violação do art. 18 da Lei 7.347/1985 (adiantamento de honorários periciais), em razão de o juízo de 1º grau ter tornado sem efeito a decisão que determinou a perícia.

2. O ônus probatório não se confunde com o dever de o Ministério Público arcar com os honorários periciais nas provas por ele requeridas, em ação civil pública. São questões distintas e juridicamente independentes. (STJ, REsp 972.902/RS, Rel. Ministra Eliana Calmon, julgado em 25-8-2009 - original sem realce)

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ADIANTAMENTO DAS DESPESAS NECESSÁRIAS À PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL. ART. 18 DA LEI Nº 7.347/85. CPC, ART. 19.

1. Não existe, mesmo em se tratando de ação civil pública, qualquer qualquer previsão normativa que imponha ao demandado a obrigação de adiantar recursos necessários para custear a produção de prova requerida pela parte autora. Não se pode confundir inversão do ônus da prova ( = ônus processual de demonstrar a existência de um fato), com inversão do ônus financeiro de adiantar as despesas decorrentes da realização de atos processuais. (STJ, REsp 846.529/MS, Rel. Ministro Teori Albino Zavaski, julgado em 19-4-2007 - original sem realce)

PROCESSO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO HABITACIONAL. PAGAMENTO DE HONORÁRIOS PERICIAIS. APLICAÇÃO DO CDC. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DE TODOS OS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO. INOBSERVÂNCIA AO BINÔMIO NECESSIDADE-UTILIDADE. SÚMULA Nº 283/STF. INCIDÊNCIA.

(...)

VI - Ademais, apenas a título de registro, destaca-se que o posicionamento adotado pelo Tribunal de origem acerca de não se confundir a inversão do ônus da prova com a obrigação de adiantamento dos honorários periciais é harmônico com o entendimento já esposado por esta Corte. Precedentes: REsp nº 661.149/SP, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, DJ de 04.09.2006; AgRg no Ag nº 634.444/SP, Rel. Min. BARROS MONTEIRO, DJ de 12.12.2005. (STJ, REsp 883.327/RJ, Rel. Ministro Francisco Falcão, julgado em 28-11-2006, original sem realce)

Consumidor. Recurso especial. Inversão do ônus da prova. Responsabilidade pelo custeio das despesas decorrentes de sua produção. Precedentes. Prova pericial requerida apenas pelo consumidor. Ônus pelo adiantamento do pagamento dos honorários do perito. Art. 33 do CPC.

Conforme entendimento da 3.ª Turma, a inversão do ônus da prova não tem o efeito de obrigar a parte contrária a arcar com as custas da prova requerida pelo consumidor. No entanto, sofre as conseqüências processuais advindas de sua não produção.

Se a prova pericial foi requerida apenas pelo autor, é apenas ele quem deve adiantar o pagamento dos honorários periciais, conforme determina o art. 33 do CPC, ainda que à demanda seja aplicável o Código de Defesa do Consumidor. (STJ, REsp 661.149/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, julgado em 17-8-2006 - original sem realce)

Dos mencionados julgados, não destoa a Jurisprudência de outros Tribunais de Justiça:

A inversão do ônus da prova não configura alteração de qual pólo processual deve adiantar a importância correspondente aos honorários provisórios do perito judicial. No caso, foi a agravada quem pleiteou a produção de prova técnica, não podendo ser estendida ao agravante, co-réu, a obrigação do recolhimento da verba correspondente. Cabe ao Juiz requisitar a verba junto à autoridade competente Recurso provido. (TJSP, Agravo de Instrumento nº 0208225-45.2011.8.26.0000, da Comarca de Macatuba, 6ª Câmara de Direito Privado Rel. Vito Guglielmi, j. 7-3-2013 - original sem realce).

AGRAVO DE INSTRUMENTO - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - ADIANTAMENTO DOS HONORÁRIOS PERICIAIS.

A inversão do ônus da prova não transfere ao réu o dever de adiantar os honorários periciais, sujeitando-o tão somente às conseqüências processuais da falta da prova que lhe competia fazer. - Recurso provido. (TJMG, Agravo de Instrumento Cv 1.0701.09.288714-3/002, Rel. Des.(a) Gutemberg da Mota e Silva, j. em 26-2-2013 - original sem realce)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. COBRANÇA. RESPONSABILIDADE SECURITÁRIA. DANOS EM IMÓVEIS POPULARES. DESPACHO SANEADOR RECONHECENDO A COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL, A APLICABILIDADE DO CDC, INVERTEU O ÔNUS DA PROVA E O ÔNUS FINANCEIRO. ENTENDIMENTO RECENTE DO STJ. APÓLICES SECURITÁRIAS DE NATUREZA PÚBLICA E PRIVADA (RAMO 66 E 68, RESPECTIVAMENTE). AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO RAMO PELA SEGURADORA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. INTELIGÊNCIA DO ART. 109, I, CF. POSSIBILIDADE DE ANÁLISE, PELO JUÍZO "A QUO", DA COMPETÊNCIA MEDIANTE A APRESENTAÇÃO DE NOVAS PROVAS. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICABILIDADE. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. DEVIDA. HIPOSSUFICIÊNCIA TÉCNICA E FINANCEIRA. PRESENTES. INVERSÃO DO ÔNUS FINANCEIRO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. AUTORAS BENEFICIÁRIAS DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA. PROVA PERICIAL SEM A ANTECIPAÇÃO DOS HONORÁRIOS (TJPR - 10ª C.Cível - AI 829206-0 - Ibiporã - Rel.: Arquelau Araujo Ribas - Unânime - j. em 28-6-2012).

Por fim, esclarece-se que não se descuida do fato de que os peritos nomeados, eventualmente, podem não aceitar o múnus, salvo recebendo o adiantamento dos honorários, ante a incerteza sobre o futuro.

Destarte, não concordando o expert nomeado com a realização gratuita da perícia e/ou em aguardar o final do processo, deve o juiz da causa nomear outro perito, a ser designado entre técnicos de estabelecimento oficial especializado ou repartição administrativa de ente público responsável pelo custeio da prova, para que a perícia seja realizada com a colaboração do Judiciário.

Nesse sentido, é a recomendação da Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

[...]

4. Não concordando o perito nomeado em realizar gratuitamente a perícia e/ou aguardar o final do processo, deve o juiz da causa nomear outro perito, a ser designado entre técnicos de estabelecimento oficial especializado ou repartição administrativa do ente público responsável pelo custeio da prova, devendo a perícia realizar-se com a colaboração do Judiciário. 5. Recurso especial provido, em parte, apenas para desonerar o Estado de antecipar o pagamento dos honorários periciais, sem imputar ao beneficiário da assistência judiciária, contudo, a responsabilidade pelo adiantamento de tal despesa (REsp 935.470/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, j. em 24-8-2010, original sem realce).

Ex positis, ousei divergir da douta maioria e votei no sentido de conhecer do incidente, fazendo prevalecer o entendimento sufragado pela Sexta Câmara de Direito Civil, na esteira da posição do Superior Tribunal de Justiça, para que, nos casos em que é requerida a prova pericial por ambas as partes, sendo uma delas, normalmente a autora, beneficiária de Justiça Gratuita ou Assistência Judiciária Gratuita, a inversão do ônus da prova não pode acarretar, consequentemente, a inversão do ônus de adiantar os honorários periciais.

Florianópolis, 12 de agosto de 2013.

Jaime Luiz Vicari

Desembargador

Declaração de voto vencido do Exmo. Sr. Des. João Batista Góes Ulysséa

Com a devida venia, ousei divergir da douta maioria pelos mesmos fundamentos expostos pelo eminente Des. Jaime Luiz Vicari.

Apenas acrescento que, em decisões recentes, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em consonância com o entendimento pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça, tem apontado:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA. MÚTUO HABITACIONAL. VÍCIOS CONSTRUTIVOS. COMPETÊNCIA JUSTIÇA ESTADUAL. A admissão da CAIXA, como assistente simples (art. 50, do CPC), nas ações envolvendo seguros de mútuo habitacional, no âmbito do Sistema Financeiro Habitacional SFH, consistentes em apólices públicas, do Ramo 66, está condicionada aos seguintes requisitos: a) que o contrato tenha sido celebrado no período de 02.12.1988 a 29.12.2009; b) o instrumento deve estar vinculado ao Fundo de Compensação de Variações Salariais FCVS e, c) a instituição financeira deve provar documentalmente o seu interesse jurídico, mediante demonstração da existência de apólice pública, e do comprometimento do FCVS, com risco efetivo de exaurimento da reserva técnica do Fundo de Equalização de Sinistralidade da Apólice FESA. - PAGAMENTO DE HONORÁRIOS PERICIAIS. PERÍCIA REQUERIDA PELA PARTE AUTORA. AGRAVADA BENEFICIÁRIA DA JUSTIÇA GRATUITA. ISENÇÃO DOS HONORÁRIOS PERICIAIS. A regra contida no artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor implica, tão-somente, inversão do ônus da prova prevista no artigo 333 do Código de Processo Civil e não a inversão da obrigação do pagamento previsto no artigo 33 do aludido Diploma. Logo, cumpre a autora (porque requereu a perícia) suportar o pagamento dos honorários periciais. Sucede, contudo, que a agravada é beneficiária da justiça gratuita, de forma que, nessa hipótese, incumbe ao Estado, e não a ela, o pagamento dos honorários periciais. Muitas vezes, não há como obrigar o Estado a suportar tal encargo, razão pela qual o Superior Tribunal de Justiça tem se manifestado, caso o perito não concorde em receber ao final, pela nomeação de um técnico de estabelecimento oficial especializado ou repartição administrativa do ente público responsável pelo custeio da produção da prova pericial, que deve ocorrer em colaboração com o Poder Judiciário. AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO. (Agravo de Instrumento n. 70055197297, Sexta Câmara Cível, rel. Des. Luís Augusto Coelho Braga, j. 1º-8-2013, grifei).

E, do Superior Tribunal de Justiça:

RECURSO ESPECIAL. HONORÁRIOS PERICIAIS. JUSTIÇA GRATUITA. RESPONSABILIDADE DO ESTADO PELA SUA REALIZAÇÃO.

1. O fato de o beneficiário da justiça gratuita não ostentar, momentaneamente, capacidade econômica de arcar com o adiantamento das despesas da perícia por ele requerida não autoriza, por si só, a inversão do ônus de seu pagamento.

2. O Estado não está obrigado a adiantar as despesas com a realização da prova pericial.

3. Não concordando o perito nomeado em aguardar o final do processo, para o recebimento dos honorários, deve o Juízo a quo nomear outro perito, a ser designado entre técnicos de estabelecimento oficial especializado ou repartição administrativa da entidade pública responsável pelo custeio da prova pericial. Precedentes.

4. Recurso especial provido em parte. (REsp n. 1355519/ES, rel. Min. Castro Meira, j. 2-5-2013, sem grifo no original).

Portanto, voto no sentido de conhecer o presente incidente, com a adoção do entendimento destacado nos precedentes citados e de acordo com o divergente do ilustre Des. Jaime Luiz Vicari.

Florianópolis, 22 de agosto de 2013.

João Batista Góes Ulysséa

Desembargador

Declaração de voto vencido do Exmo. Sr. Des. Ronei Danielli

Os motivos pelos quais ousei dissentir da douta maioria e votar no sentido do acolhimento do incidente de uniformização de jurisprudência, encontram-se explicitados de forma irretocável no voto vencido do Exmo. Sr. Des. Jaime Luiz Vicari, acrescido pelos fundamentos trazidos no voto vencido do Exmo. Sr. Des. João Batista Goés Ulysséa. Sendo assim, reporto-me aos referidos votos para fundamentar a razão da minha divergência.

Florianópolis, 29 de agosto de 2013.

Des. Ronei Danielli

Declaração de voto vencido do Excelentíssimo Senhor Desembargador Jairo Fernandes Gonçalves.

Os motivos pelos quais ousei dissentir da douta maioria são os mesmos já muito bem explanados nos votos vencidos dos eminentes Desembargadores Jaime Luiz Vicari e João Batista Góes Ulysséa, razão pela qual, acompanhando suas fundamentações, em especial a proferida pelo Desembargador Jaime Luiz Vicari, registro meu voto vencido no sentido de conhecer o incidente de uniformização de jurisprudência para que, nos casos em que se postula a realização de prova pericial por ambos os litigantes, e sendo um deles beneficiário da justiça gratuita ou da assistência judiciária gratuita, a inversão do ônus da prova não pode ensejar a inversão da obrigação de adiantar os honorários periciais.

Florianópolis, 23 de setembro de 2013.

Jairo Fernandes Gonçalves

Desembargador