Conflito negativo de competência n° 123 da comarca de Santa Cecília

Relator: Des. Wilson Antunes. Conflito Negativo de Competência.

Juiz de Direito promovido para outra Comarca.Processo cuja instrução concluiu antes de afastar-se do Juízo. Deu-se por incompetente para julgar o feito sob alegação de que não colheu prova em audiência. Conflito negativo de competência suscitado pelo Magistrado que o sucedeu no Juízo, com base no art. 132 do C.P.C.

Conflito procedente. O Juiz que concluiu a instrução antes de afastar-se da Comarca, vincula-se ao feito, mesmo que não haja colhido prova em audiência. O art. 132 do C.P.C. não alude a colheita de prova. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Conflito Negativo de Competência n. 123, da Comarca de Santa Cecília, em que é suscitante o Dr. Geraldo da Rocha Loures Reichmann, Juiz Substituto, sendo suscitado o Dr. Gildo Kutne, Juiz de Direito da Comarca de Videira:

A C O R D A M, em Terceira Câmara Cível, por votação unânime, conhecer do conflito e julgar competente o Dr. Juiz de Direito suscitado.

Sem custas.

Nos autos da Ação de Reparação de Dano Causado em Acidente de Veículo (n. 824), tramitando no MM. Juízo de Direito da Comarca de Santa Cecília, o Dr. Gildo Kutne, ex-titular daquele Juízo, deu-se como incompetente para julgar o processo, eis que, mesmo havendo presidido audiência de instrução, foi promovido para a Comarca de Videira.

O Dr. Juiz Substituto Geraldo da Rocha Lores Reichmann, em exercício na Comarca de Santa Cecília, suscitou conflito negativo de jurisdição, por entender competente para o julgamento o mencionado ex-titular desta última Comarca referida.

A douta Procuradoria Geral do Estado, exarando Parecer sobre a matéria, entendeu que o MM. Juiz Suscitado deve julgar o feito.

Como está registrado a f. 221 e seguintes, o Dr. Juiz de Direito suscitado presidiu a audiência de instrução e julgamento relativa ao processo em tela, quando as partes apresentaram memoriais. Também o Dr. Promotor exarou Parecer, favorável à procedência do pedido. Foram exibidos documentos por ambas as partes, pelo que materializou-se a produção de provas.

Dispõe o art. 132 do C.P.C.vigente:

"O juiz, titular ou Substituto, que iniciar a audiência, concluirá a instrução, julgando a lide, salvo se for transferido, promovido ou aposentado; casos em que passará os autos ao seu sucessor. Ao recebê-los, o sucessor prosseguirá na audiência, mandando repetir, se entender necessário, as provas já produzidas" (o grifo é nosso).

Preliminarmente, é de lamentar-se que o dispositivo legal transcrito haja sido redigido com erro tão crasso de técnica administrativa. Com efeito, o verbo "transferir" não se enquadra na hipótese prevista. O Juiz de Direito jamais poderá ser "transferido', eis que "transferir", em Direito Constitucional ou Administrativo, indica mudança de carreira. Transfere-se o funcionário público de uma carreira para outra equivalente, verbi gratia de Escriturário para Oficial Administrativo, se os vencimentos se equivalerem. O Juiz de Direito jamais poderá ser "transferido", mas sim "removido", que indica mudança de Comarca de igual entrância.

Se os legisladores "claudicam" em questão evidentemente comesinha de Direito,a Nação há que temer decadência das suas instituições.

Permissa venia da respeitável opinião em contrário, a razão posta-se a favor do MM. Juiz suscitante.

A leitura do mandamento legal invocado conclui-se, prima facie, que a vinculação do Juiz à causa tem lugar - apenas - enquanto ele permanecer no Juízo em que tramita o processo. Se "iniciar a audiência, concluirá a instrução, julgando a lide". Todavia, se, mesmo tendo iniciado a audiência, for removido, promovido ou aposentado, "passará os autos ao seu sucessor". Em ocorrendo qualquer dessas hipóteses, ficará automaticamente desvinculado do processo. É tanto que "o sucessor prosseguirá na audiência". É claro que o prosseguimento da audiência pressupõe instrução incompleta, ainda não concluída. O novo Juiz que receber os autos terminará a instrução, realizando as provas faltantes. Poderá mesmo,"se entender necessário, repetir as provas já produzidas",naturalmente para formar melhor convicção.

Se, entretanto, o antigo Juiz houver concluído a instrução (é o caso ora in juditio), não há qualquer motivo legal para remeter o processo ao novo titular do Juízo. Já se vinculou ao feito antes do ato que o afastou da Comarca.

É o que depreende, sem possibilidade, data venia, de outro entendimento, da simples leitura do art. 132 do C.P.C.

Com sobradas razões o Dr. Geraldo da Rocha Loures Reichmann, MM. Juiz suscitante, quando afirma (f. 273): "E a parte final do Art. 132 da Lei Adjetiva Civil, ao dizer que o sucessor prosseguirá na Audiência, está a indicar que a regra excepcional não se endereça a aquelas hipóteses, em que não há mais Audiências a prosseguir, pois resta apenas e tão-somente que o Juiz profira a Sentença, o que não precisa ocorrer em Audiência. Ademais não se pode prosseguir no que já está concluído".

Já decidiu a Egrégia 2a. Câmara Cível deste Colendo Tribunal, em Acórdão unânime de 18.10.1979, de lavra do eminente Des. Osny Caetano: "O juiz suscitado, transferido, por promoção ou remoção deve julgar os processos cuja instrução ultimou" (Ementa).

Eis por que a Câmara conheceu do conflito e julgou competente o Dr. Juiz de Direito suscitado, a quem os autos deverão ser remetidos, para julgamento da causa.

Florianópolis, 26 de agosto de 1980.

Reynaldo Alves PRESIDENTE
Wilson Antunes 
RELATOR
Nauro Collaço
Ruy Olympio de Oliveira
PROCURADOR DO ESTADO