Incidente de Uniformização da Jurisprudência em Embargos Infringentes n. 2006.022802-2 de Tubarão

Relator designado: Des. Cesar Abreu.

INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA. ISS. ARRENDAMENTO MERCANTIL (LEASING). INCIDÊNCIA.

É aplicável ao arrendamento mercantil de coisas móveis a Súmula 138 do STJ.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Incidente de Uniformização da Jurisprudência em Embargos Infringentes n. 2006.022802-2, da comarca de Tubarão, em que são suscitantes os membros efetivos do Grupo de Câmaras de Direito Público:

ACORDAM, em Grupo de Câmaras de Direito Público, por maioria de votos, deliberaram os membros efetivos do Grupo de Câmaras de Direito Público, em não remeter os autos à Procuradoria-Geral de Justiça em face do Ato 103/2004, bem como de reiteradas manifestações nos autos no sentido de incabimento de intervenção do Ministério Público. O Exmo. Sr. Des. Cid Goulart entende em sentido contrário. Decidiram, por maioria de votos, não suspender a tramitação do incidente de uniformização de jurisprudência, vencidos os Exmos. Srs. Des. Nicanor da Silveira e Vanderlei Romer, que votaram pelo sobrestamento dos autos até manifestação do Excelso Pretório, em virtude do Superior Tribunal de Justiça ter suspenso a tramitação de Recursos Especiais, diante da interposição concomitante de Recursos Extraordinários. Suspensos os Embargos Infringentes, suscitado o incidente de uniformização de jurisprudência, por maioria absoluta dos membros efetivos do Grupo de Câmaras de Direito Público, foi deliberado, no que diz respeito à tese jurídica, de que há incidência de ISS sobre as operações de Arrendamento Mercantil, sendo vencedores os Exmos. Srs. Des. Cesar Abreu, Cid Goulart, Francisco Oliveira Filho, Orli Rodrigues e Volnei Carlin, e vencidos os Exmos. Srs. Des. Nicanor da Silveira, Luiz Cézar Medeiros e Vanderlei Romer que votaram pela não incidência. Não participou do julgamento a Exma. Sra. Desa. Sônia Schmitz em face da deliberação do egrégio Tribunal Pleno desta Corte, que entende que nos casos de incidência de uniformização de jurisprudência, só votam os membros efetivos. Designado para o acórdão, o Exmo. Sr. Des. Cesar Abreu.
Sem custas.

I - RELATÓRIO:

Cuida-se de Incidente de Uniformização da Jurisprudência suscitado, ex officio, por membro efetivo do Grupo, com fundamento no art. 476 do CPC, quando do julgamento dos Embargos Infringentes n. 2006.022802-2, em que é embargante o Município de Tubarão e embargada Banrisul S.A. Administradora de Consórcios, em face da divergência existente entre as Câmaras Isoladas de Direito Público quanto à tese da incidência ou não do ISS nas operações de arrendamento mercantil (leasing) de coisas móveis (a favor: Apelações Cíveis n. 2006.009605-4, 2006.024205-3 e 2006.001068-3; contra: Apelações Cíveis n. 2006.023902-5, 2006.007523-2 e 2006.017217-2).
Suspenso o julgamento dos Embargos Infringentes, definida a necessidade do voto da maioria absoluta dos membros efetivos do Grupo de Câmaras para efeito da uniformização, bem assim pela desnecessidade da intervenção da Procuradoria-Geral de Justiça, reafirmada em diversas manifestações judiciais e referendada pelo Ato n. 103/2004, afastada a proposta de sobrestamento do feito, calcada nos recentes julgamentos do Superior Tribunal de Justiça que remetem a controvérsia à apreciação do Supremo Tribunal Federal, sobreveio o julgamento do incidente, ficando afirmada, pela maioria absoluta dos membros efetivos do Grupo, a tese jurídica da incidência do ISS na operação de arrendamento mercantil (leasing) sobre coisas móveis.

II - VOTO:

Reconhecida a divergência no seio das Câmaras Isoladas de Direito Público, submetida à discussão a tese jurídica correspondente, prevaleceu o entendimento da incidência do ISS na operação de arrendamento mercantil (leasing) sobre coisas móveis.

Assim sendo, dando cumprimento ao que preceitua o art. 478 do CPC, segunda parte, que diz competir a -cada juiz emitir o seu voto em exposição fundamentada-, adota-se como razão de decidir os argumentos expendidos por este Relator por ocasião do julgamento, dentre outros, dos Embargos Infringentes n. 2006.022103-5.

Pois bem, discute-se nestes autos a exigência do ISS - Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza incidente na operação de leasing sobre bens móveis.

A matéria, que era pacífica diante do enunciado da Súmula 138 do STJ, passou a ser controvertida com o julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, do RE n. 116.121-3.
Enunciam as manifestações das altas Cortes do País:

`1. Súmula 138: 'O ISS incide na operação de arrendamento mercantil de coisas móveis'.

`2. RE n. 116.121-3: IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS. CONTRATO DE LOCAÇÃO. A terminologia constitucional do Imposto Sobre Serviços revela o objeto da tributação. Conflita com a Lei Maior dispositivo que imponha o tributo considerado contrato de locação de bem móvel. Em Direito, os institutos, as expressões e os vocábulos têm sentido próprio, descabendo confundir a locação de serviços com a de móveis, práticas diversas regidas pelo Código Civil, cujas definições são de observância inafastável - art. 110 do Código Tributário Nacional.-

Essa aparente diversidade interpretativa vem sendo superada pelo colendo Superior Tribunal de Justiça, que tem reafirmado a coexistência e, portanto, subsistência da Súmula 138 com o entendimento esposado pelo STF no RE n. 116.121-3: o primeiro, dirigido ao arrendamento mercantil, contrato típico, um misto de locação e compra e venda; o segundo, voltado à locação, pura e simples, de bens móveis (AgRg na Medida Cautelar n. 7.698/RS). 

E a motivação é bastante simples: o leasing, diversamente do que ocorre com a locação de bem móvel, enverga natureza jurídica peculiar, revelando negócio jurídico complexo, misto de locação e compra e venda, com feição financeira.

Ora, inúmeros precedentes do STF, anteriores ao RE n. 116.121-3, ao tratarem da incidência do ISS nas operações de leasing, admitiram como razoável o entendimento de que a prestação habitual, pela empresa, de serviço consubstanciado no arrendamento mercantil (leasing) de bens móveis sujeita-se ao tributo em referência, pelo simples fato de ter a Constituição Federal, ao prever a tributação sobre serviços de qualquer natureza, adotado o `conceito econômico- de `serviço-, que não se confunde com o da `prestação de serviço- regrado pelo Código Civil (RE n. 113.383-0 e RE n. 112.947-6).
-Assim, se o conceito de serviço é o econômico, não há dar aplicação ao comando do art. 110 do Código Tributário Nacional, que veda promova a lei tributária a alteração do conceito e alcance de institutos de direito privado. 

No RE n. 100.779 (RTJ 109/799-808) ficou consignado que `o conceito de serviço, que impera no direito tributário, não é mais o mesmo do Direito Civil, mas o que se ampliou na interpretação econômica dos serviços, postos como meio de satisfação das necessidades imateriais, como os bens o são para as necessidades materiais. É o conceito tradicional de serviço em economia, ampliado da tradicional locação de serviços do Código Civil, que contrabalançava com a locação de coisas, e se atinha, sobretudo, à locação de trabalho - serviço pessoal do trabalhador, para abranger os serviços impessoais, que constituem hoje, o setor mais importante e mais significativo da atividade econômica-.
Não sensibiliza o argumento trazido por ocasião do julgamento do presente incidente, segundo o qual o próprio STJ estaria afastando em casos como o da espécie, o verbete da Súmula 138. Primeiro, porque não se trata de orientação consolidada naquela Corte; segundo, porque as decisões do STJ, que afastam o conhecimento do especial, são bem claras, dizendo que assim procediam visto que a questão debatida teria sido solucionada pelo Tribunal de origem à luz de princípios constitucionais, o que revelaria a impossibilidade de exame da matéria em sede de recurso especial (STJ, Ag. n. 769.746); terceiro, porque sendo Súmula não é lei, pelo que não a abrange a norma constitucional propiciadora da via especial (REsp n. 865.483-SC).

Por essas razões é que também este Relator votou contra o sobrestamento do julgamento. Aliás, reanimado pela decisão monocrática do Min. Francisco Falcão, D.J. de 31.20.2006 (REsp n. 866.287), pelo qual mantém viva a Súmula 138 do STJ, expressando, ainda, ao referir-se ao entendimento do STF, no RE n. 116.121/SP: -... tal declaração de inconstitucionalidade foi feita de forma difusa, estendendo-se às partes envolvidas naquele processo, não havendo que se falar, com isso, em efeito erga omnes. Por fim, no presente caso, a natureza jurídica do contrato é diversa, porquanto se trata de leasing financeiro e não de locação de bens móveis prestada por empresa de guindastes, como no aludido recurso junto ao STF-.

Ao concluir, cumpre registre-se que, não sendo permitido examinar outras questões jurídicas estranhas à controvérsia, e muito menos questões de fato, sejam quais forem, ou ainda, sendo irrecorrível esta decisão, os autos devem retornar ao Relator dos Embargos Infringentes para que complete o julgamento.

III - DECISÃO:

Diante do exposto, por maioria de votos, deliberaram os membros efetivos do Grupo de Câmaras de Direito Público, em não remeter os autos à Procuradoria-Geral de Justiça em face do Ato 103/2004, bem como de reiteradas manifestações nos autos no sentido de incabimento de intervenção do Ministério Público. O Exmo. Sr. Des. Cid Goulart entende em sentido contrário. Decidiram, por maioria de votos, não suspender a tramitação do incidente de uniformização de jurisprudência, vencidos os Exmos. Srs. Des. Nicanor da Silveira e Vanderlei Romer, que votaram pelo sobrestamento dos autos até manifestação do Excelso Pretório, em virtude do Superior Tribunal de Justiça ter suspenso a tramitação de Recursos Especiais, diante da interposição concomitante de Recursos Extraordinários. Suspensos os Embargos Infringentes, suscitado o incidente de uniformização de jurisprudência, por maioria absoluta dos membros efetivos do Grupo de Câmaras de Direito Público, foi deliberado, no que diz respeito à tese jurídica, de que há incidência de ISS sobre as operações de Arrendamento Mercantil, sendo vencedores os Exmos. Srs. Des. Cesar Abreu, Cid Goulart, Francisco Oliveira Filho, Orli Rodrigues e Volnei Carlin, e vencidos os Exmos. Srs. Des. Nicanor da Silveira, Luiz Cézar Medeiros e Vanderlei Romer que votaram pela não incidência. Não participou do julgamento a Exma. Sra. Desa. Sônia Schmitz em face da deliberação do egrégio Tribunal Pleno desta Corte, que entende que nos casos de incidência de uniformização de jurisprudência, só votam os membros efetivos. Designado para o acórdão, o Exmo. Sr. Des. Cesar Abreu.

Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Exmos. Srs. Desembargadores Cid Goulart, Orli Rodrigues e Volnei Carlin e, com voto vencido, os Exmos. Srs. Desembargadores Nicanor da Silveira, Luiz Cézar Medeiros e Vanderlei Romer. Funcionou como representante do Ministério Público o Exmo. Sr. Dr. Paulo Roberto de Carvalho Roberge.

Florianópolis, 08 de novembro de 2006.

Francisco Oliveira Filho
PRESDENTE, COM VOTO VENCEDOR

Cesar Abreu
RELATOR DESIGNADO

Declaração de voto vencido do Exmo. Sr. Desembargador Nicanor da Silveira.

EMENTA ADITIVA (art. 148, § 3o, do Regimento Interno, publ. DJSC n. 10.033, de 14.08.98).
INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA - TRIBUTÁRIO - ISS - OPERAÇÕES DE ARRENDAMENTO MERCANTIL (LEASING).

-1. Ao tratar do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, a Constituição Federal pressupôs a "prestação de serviços", segundo a conceituação definida no direito privado (CF, art. 156, inc. III, CTN, art. 110).

A qualificação de operações não condizentes com o significado técnico-jurídico da expressão "prestação de serviços", para efeito de tributação municipal do ISS, nada mais significa do que a inadmissível e arbitrária manipulação, por lei complementar, da repartição constitucional de competências impositivas, pois o tributo em comento somente pode incidir sobre obrigações de fazer (RE n. 116.121-3/SP, Min. Celso de Mello).

2. O leasing financeiro, ao contrário do leasing operacional, não alberga 'prestação de serviço'. Não será por disposição legal que a sua natureza poderá ser alterada. A lei não tem o condão de modificar a essência das coisas ou dos fatos. Definir como prestação de serviço aquilo que essencialmente não o é, traduz-se em uma forma escamoteada de burlar a limitação constitucional de incidência tributária.
Desse modo, a incidência do ISS sobre operações de leasing, prevista no item 79 da relação anexa ao Decreto n. 406/68 e no item 15.09 do novo rol constante da LC n. 116/2003, diz respeito exclusivamente à modalidade de leasing operacional ou às atividades do agente financeiro que possam efetivamente ser enquadradas como prestação de serviços e já não estejam sujeitas ao Imposto Sobre Operações Financeiras.(...)- (EI n. 2004.001789-8, de Criciúma, j. 12/5/04, Des. Luiz Cézar Medeiros).

1. Primeiramente, divergi da douta maioria, data venia, por entender prudente o sobrestamento do trâmite do presente incidente de uniformização de jurisprudência até pronunciamento específico do Excelso Pretório, sobretudo, em razão do Superior Tribunal de Justiça haver suspensa a tramitação de Recursos Especiais, diante da interposição concomitante de Recursos Extraordinários, como fulcro no § 2º do artigo 543 do Código de Processo Civil, in verbis: -Na hipótese de o relator do recurso especial considerar que o recurso extraordinário é prejudicial àquele, em decisão irrecorrível sobrestará o seu julgamento e remeterá os autos ao Supremo Tribunal Federal, para o julgamento do recurso extraordinário.-

2. Divergi no outro ponto, por entender que sobre a operação de arrendamento mercantil, modalidade leasing financeiro, não há incidência do ISS, já que a atividade em questão não envolve prestação de um serviço. 

A respeito do tema, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 116.121-3-SP, proclamou, em controle difuso, a inconstitucionalidade da expressão -locação de bens móveis-, constante no item 79 da lista de serviços do Decreto Lei n. 406/68, com as alterações decorrentes da LC n. 56/87, que, na sua íntegra constava: -locação de bens móveis, inclusive arrendamento mercantil.-

Oportuno e necessário, então, reproduzir a ementa da supra aludida decisão do Excelso Pretório: 
-TRIBUTO - FIGURINO CONSTITUCIONAL. A supremacia da Carta Federal é conducente a glosar-se a cobrança de tributo discrepante daqueles nela previstos. IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS - CONTRATO DE LOCAÇÃO. A terminologia constitucional do Imposto sobre Serviços revela o objeto da tributação. Conflita com a Lei Maior dispositivo que imponha o tributo considerado contrato de locação de bem móvel. Em Direito, os institutos, as expressões e os vocábulos têm sentido próprio, descabendo confundir a locação de serviços com a de móveis, práticas diversas regidas pelo Código Civil, cujas definições são de observância inafastável - artigo 110 do Código Tributário Nacional-. (RE 116.121-3/SP, rel. p/ acórdão Min. Marco Aurélio, DJ. 11.10.00).

A partir daí, a exegese da Súmula 138 do Superior Tribunal de Justiça, a qual proclama que -O ISS incide na operação de arrendamento mercantil de coisas móveis-, passou a ser revista neste Tribunal por suas Câmaras de Direito Público, exsurgindo divergências sobre o assunto, até que o colendo Grupo de Câmaras de Direito Público, em acórdão da lavra do eminente Des. Luiz Cézar Medeiros, decidiu:

-TRIBUTÁRIO - ISS - OPERAÇÃO DE LEASING SOBRE BENS MÓVEIS - LEASING FINANCEIRO - NÃO INCIDÊNCIA - EXEGESE DO ART. 156, INC. III DA CF E ART. 110 DO CTN.

1. Ao tratar do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, a Constituição Federal pressupôs a "prestação de serviços", segundo a conceituação definida no direito privado (CF, art. 156, inc. III, CTN, art. 110).

A qualificação de operações não condizentes com o significado técnico-jurídico da expressão "prestação de serviços", para efeito de tributação municipal do ISS, nada mais significa do que a inadmissível e arbitrária manipulação, por lei complementar, da repartição constitucional de competências impositivas, pois o tributo em comento somente pode incidir sobre obrigações de fazer (RE n. 116.121-3/SP, Min. Celso de Mello).

2. O leasing financeiro, ao contrário do leasing operacional, não alberga 'prestação de serviço'. Não será por disposição legal que a sua natureza poderá ser alterada. A lei não tem o condão de modificar a essência das coisas ou dos fatos. Definir como prestação de serviço aquilo que essencialmente não o é, traduz-se em uma forma escamoteada de burlar a limitação constitucional de incidência tributária.
Desse modo, a incidência do ISS sobre operações de leasing, prevista no item 79 da relação anexa ao Decreto n. 406/68 e no item 15.09 do novo rol constante da LC n. 116/2003, diz respeito exclusivamente à modalidade de leasing operacional ou às atividades do agente financeiro que possam efetivamente ser enquadradas como prestação de serviços e já não estejam sujeitas ao Imposto Sobre Operações Financeiras.

3. Não se afina com as normas de regência do Imposto sobre Serviços, e muito menos com a natureza jurídica do tributo, legislação que prevê como base de cálculo o próprio valor do bem alienado, financiado ou locado, acrescido de hipotéticos juros a título de encargos financeiros presumidos- (EI n. 2004.001789-8, de Criciúma, j. 12/5/04).

Verdade que a declaração de inconstitucionalidade não se estendeu à expressão -arrendamento mercantil-, contudo, a fundamentação dos votos dos membros daquela Corte, conforme assentado no voto condutor do acórdão ora embargado, é expressivo no sentido de que somente incidirá ISS em operações que incorporem prestação de serviço, o que, por certo, não é o caso do leasing financeiro.
E no corpo daquele acórdão relatado pelo Desembargador Luiz Cézar Medeiros, este transcreve do voto condutor no julgamento supra citado do STF e agrega fundamentos que assim são reproduzidos como razão de decidir:

-Indago se, no caso, o proprietário do guindaste coloca à disposição daquele que o loca também algum serviço. Penso que não. Creio que aí se trata de locação pura e simples, desacompanhada, destarte, da prestação de serviços. Se houvesse o contrato para essa prestação, concluiria pela incidência do tributo.

Em face do texto da Constituição Federal e da legislação complementar de regência, não tenho como assentar a incidência do tributo, porque falta o núcleo dessa incidência, que são os serviços. Observem-se os institutos em vigor tal como se contém na legislação de regência. As definições de locação de serviços e locação de móveis vêm-nos do Código Civil e, aí, o legislador complementar, embora de forma desnecessária e que somente pode ser tomada como pedagógica, fez constar no Código Tributário o seguinte preceito:

Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias. 

O preceito veio ao mundo jurídico como um verdadeiro alerta ao legislador comum, sempre a defrontar-se com a premência do Estado na busca de acréscimo de receita.
Relembrem-se as noções dos referidos contratos, de que cuidam os artigos 1.188 e 1.216 do Código Civil:

`Art. 1.188. Na locação de coisas, uma das partes se obriga a ceder à outra, por tempo determinado, ou não, o uso e gozo de coisa não fungível, mediante certa retribuição.
`Art. 1.216. Toda a espécie de serviço ou trabalho lícito, material ou imaterial, pode ser contratada mediante retribuição.

A hipótese assemelha-se ao quadro com o qual se defrontou o Tribunal de Recurso Extraordinário n. 166.772-9-RS, quando veio a glosar a exigência da contribuição social sobre a remuneração paga a administradores e autônomos. O pretexto da incidência estaria na igualização econômica entre o que satisfeito a tal título e o salário, olvidando-se advertência doutrinária sobre a realidade jurídica conceitual, a sobrepor-se ao aspecto simplesmente econômico. Na emenda do precedente, proclamou o Plenário:

`O conteúdo político de uma Constituição não é conducente ao desprezo do sentido vernacular das palavras, muito menos ao do técnico, considerados institutos consagrados pelo Direito-. 
Cumpre ter presente, sobre a matéria, as palavras de Ulhoa Canto, no que citadas por Grabriel Lacerda Troianelli em artigo publicado sob o título `o ISS sobre a locação de bens móveis- na revista Dialética de Direito Tributário n. 28. Analisando precisamente o julgamento deste processo que então se iniciara, disse o autor do artigo da irrelevância do aspecto econômico quando contrário ao modelo constitucional do tributo, secundado pela definição dos institutos envolvidos. Eis as oportunas palavras do saudoso tributarista:

Entre nós, a interpretação econômica não tem sido acolhida, nem pelos autores nem pela jurisprudência. A própria Coordenação do Sistema de Tributação chegou até a afirmar a sua inaceitabilidade, no Parecer Normativo CST n° 563, de 18.08.1971 (...) Entretanto, é comum ler-se em atos ou decisões da Administração ou de tribunais administrativos que ao direito tributário interessam precipuamente os aspectos econômicos (o que é certo), e, por isso, os dispositivos legais, como os atos e fatos, devem ser interpretados com prevalência do respectivo conteúdo econômico, relegada a sua forma jurídica a plano secundário (ilação errada). Na verdade, trata-se de uma simples tentativa de usurpação de poderes que são apenas do legislador; sob o pretexto de interpretar a lei, o que se está tentando é aplicar a sua norma a tos e fatos que ela não contempla. (Caderno de Pesquisas Tributárias n° 13. São Paulo: Resenha Tributária, 1989, p. 493).

Em síntese, há de prevalecer a definição de cada instituto, e somente a prestação de serviços, envolvido na via direta do esforço humano, é fato gerador do tributo em comento. Prevalece a ordem natural das coisas cuja força surge insuplantável; prevalecem as balizas constitucionais e legais, a conferirem segurança às relações Estado-contribuinte; prevalece, ao fim, a organicidade do próprio Direito, sem o qual, tudo será possível no agasalho de interesses do Estado, embora não enquadráveis como primários.

Pela alínea `c-, conheço do recurso do contribuinte e dou-lhe provimento. Declaro a inconstitucionalidade dos dispositivos que prevêem essa incidência.-

Pela importância da matéria e principalmente pela radical alteração do entendimento de há muito pacificado, é importante também que se registre o voto do eminente Ministro Celso de Mello:
`A questão ora em julgamento neste recurso extraordinário concerne, precisamente, ao tema da alegada inconstitucionalidade da Expressão `locação de bens móveis- constante do item n. 79 da Lista de Serviços a que alude o art. 8º do DL n. 406/68, na redação que lhe deu a Lei Complementar n. 56/87, bem assim da suposta ilegitimidade constitucional dessa mesma expressão (`locação de bens móveis-) inscrita no item n. 78 da Lista de Serviços referida no § 3º do art. 50 da Lei n. 3.750, de 20/12/71, do Município de Santos/SP.

Sabemos que a tributalidade dos serviços de qualquer natureza, não compreendidos na esfera de competência impositiva das demais pessoas estatais, traduz prerrogativa que pertence aos Municípios, os quais, para esse efeito, ainda que em caráter residual (RICARDO LOBO TORRES, `Curso de Direito Financeiro e Tributário-, p. 331, item n. 7.4, 2 ed., 1995, Renovar), dispõem do poder de instituir o ISS relativamente aos serviços definidos em lei complementar editada pela União Federal (CF/69, art. 24, II; CF/88, art. 156, III).

A lista de serviços é taxativa (RTJ 89/281). O rol que nela se contém constitui numerus clausus, embora admissível a sua interpretação compreensiva (RDA 118/155, Re. Min. THOMPSON FLORES). O que se não pode aceitar - até como natural consectário do princípio constitucional da reserva de lei em matéria tributária - é a inovação do rol, para, nele, acrescentar-se, em sede normativa local, categoria de serviços não prevista na lista elaborada pela União Federal. (não grifado no original)
Os itens ora questionados na presente sede recursal extraordinária, constante das Listas de serviços a que se referem os diplomas legislativos da União Federal e do Município de Santos/SP, tornam tributável, mediante incidência do ISS, a `locação de bens móveis-.

É nesse específico ponto, portanto, que reside a controvérsia suscitada na presente causa, cuja discussão torna necessário indagar se se revela juridicamente lícita, para efeito tributário, a qualificação normativa das obrigações fundadas no negócio contratual de locação de bens como atividade caracterizadora de prestação de serviços, para fins de incidência do ISS.

Tenho para mim, na mesma linha de entendimento exposta por AIRES FERNANDINO BARRETO (`Revista de Direito Tributário-, vol. 38/196), que a qualificação da `locação de bens móveis-, como serviço, para efeito de tributação municipal mediante incidência do ISS, nada mais significa do que a inadmissível e arbitrária manipulação, por lei complementar, da repartição constitucional de competências impositivas, eis que o ISS somente pode incidir sobre obrigações de fazer, a cuja matriz conceitual não se ajusta a figura contratual da locação de bens móveis.

Cabe advertir, neste ponto, que a locação de bens móveis não se identifica e nem se qualifica, para efeitos constitucionais, como serviço, pois esse negócio jurídico - considerados os elementos essenciais que lhe compõem a estrutura material - não envolve a prática de atos que consubstanciam um praestare ou um facere. (não grifado no original)

Na realidade, a locação de bens móveis configura verdadeira obrigação de dar, como resulta claro do art. 1.188 do Código Civil: `Na locação de coisas, uma das partes se obriga a ceder à outra, por tempo determinado, ou não, o uso de coisa não fungível, mediante certa retribuição- (grifo do autor).
Esse entendimento - que identifica, na figura contratual da locação de bens móveis, a presença de uma típica obrigação de dar, fundada na cessão de coisa não fungível - encontra apoio em autorizado magistério doutrinário (SILVIO RODRIGUES, `Direito Civil-, vol. 3/209-211, itens ns. 88/90, 23 ed., 1995, Saraiva; CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA, `Instituições de Direito Civil-, vol. III/250-254, item n. 238, 5 ed. 1981, Forense; ORLANDO GOMES, `Contratos-, p. 328, 330/332 e 335, itens ns. 209/210 e 214, 7 ed., 1979, Forense, v.g.).

Insista-se, portanto, na asserção de que, para efeito de configuração do contrato de locação de coisas (locatio rerum, que se distingue, juridicamente, da locatio operarum e da locatio operis faciendi), a entrega de coisa não fungível constitui, nos termos de nosso estatuto civil (art. 1.188 c/c o art. 1.189, I), um dos essencialia negotii, como acentua MARIA HELENA DINIZ (`Curso de Direito Civil Brasileiro-, vol. 3/194, 6 ed., 1989, Saraiva):

-A entrega da coisa locada é o principal dever do locador, por ser ela um meio indispensável para o fruição do uso e gozo do bem, o que constitui elemento essencial do contrato de locação. Sem tal entrega, a locação não se efetiva-. 

O fato irrecusável é um só: a Constituição, quando atribui competência impositiva ao Município para tributar serviços de qualquer natureza, não compreendidos na competência das outras pessoas políticas, exige que só se alcancem, mediante incidência do ISS, os atos e fatos que se possam qualificar, juridicamente, como serviços. (não grifado no original)

Cumpre assinalar, por necessário, especialmente em face das considerações expostas, que a legislação tributária, emanada de qualquer das pessoas políticas, não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, para definir ou limitar competências tributárias. (não grifado no original)

Veja-se, pois, que, para efeito de definição e de identificação do conteúdo e do alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, o Código Tributário Nacional, em seu art. 110, `faz prevalecer o império do Direito Privado - Civil ou Comercial ...- (ALIOMAR BALEEIRO, -Direito Tributário Brasileiro-, p. 687, item n. 2, atualizado pela Professora MISABEL ABREU MACHADO DERZI, 11 ed., 1999, Forense), razão pela qual esta Suprema Corte, para fins jurídico-tributários, não pode recusar, ao instituto da locação de bens móveis, a definição que lhe é dada pelo Código Civil (art. 1.188), sob pena de prestigiar, no tema, a interpretação econômica do direito tributário, em detrimento do postulado da tipicidade, que representa, no contexto de nosso sistema normativo, projeção natural e necessária do princípio constitucional da reserva absoluta de lei, consoante adverte o magistério da doutrina (GILBERTO DE ULHÔA CANTO, in Caderno de Pesquisas Tributárias n. 13/493, 1989, Resenha Tributária; GABRIEL LACERDA TROIANELLI, `O ISS sobre a Locação de Bens Móveis-, in Revista Dialética de Direito Tributário, vol. 28/7-11, 8-9).

A decisão emanada do Tribunal local - que considerou juridicamente qualificável, como serviço, a locação de bens móveis, tal como relacionada nos itens constantes das Listas de Serviços referidas anteriormente - não pode subsistir, eis que, mais do que desrespeitar o que prescreve o art. 110 do Código Tributário Nacional, transgrediu a Lei Fundamental, que, em matéria tributária, instituiu clara e rígida repartição constitucional de competências impositivas-.

O posicionamento do Supremo Tribunal Federal, pelo que se pode destacar dos votos acima transcritos, está alicerçado nos seguintes fundamentos:

a) ao tratar do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, a Constituição Federal pressupôs a `prestação de serviços-, segundo a conceituação definida no direito privado (CF, art. 156, inc. III);

b) a definição de -serviços-, `locação de serviços- e `locação de móveis- devem ser buscadas no âmbito do direito privado, observada a disposição imperativa do art. 110 do Código Tributário Nacional quanto ao conceito, conteúdo, formas e alcance desses institutos;

c) a definição e limitação das competências tributárias devem prestigiar o postulado da tipicidade e não a interpretação econômica do direito tributário;

d) o conteúdo político de uma constituição não é conducente ao desprezo do sentido técnico e vernacular das palavras, sendo indesviável a consideração dos institutos consagrados pelo Direito;

e) somente a prestação de serviços resultante diretamente do esforço humano é fato gerador do ISS, prevalecendo a organicidade do próprio Direito; 

f) tal qual a `locação de bens móveis-, a qualificação de operações não condizentes com o significado técnico e jurídico da expressão `prestação de serviços- para efeito de tributação municipal do ISS, nada mais significa do que a inadmissível e arbitrária manipulação, por lei complementar, da repartição constitucional de competências impositivas, pois o tributo em comento somente pode incidir sobre obrigações de fazer;

g) não prevalece o entendimento de que pudesse incidir o ISS sobre a simples entrega de bem a terceiro, levando-se em conta a realidade econômica e a circunstância de manter a coisa em poder daquele com a garantia de uso pacífico; (sem grifo no original)

A clareza dos elucidativos pronunciamentos permite - e as partes grifadas contribuem para isso - concluir com segurança que somente as operações resultantes de `prestação de serviço-, na sua acepção técnico-jurídica, é que ensejam a incidência do Imposto Sobre Serviços - ISS. 
Não obstante as peculiaridades do leasing em relação à locação, os fundamentos expendidos pela Corte Suprema podem e devem ser considerados para afastar a incidência do ISS nos casos de aquisição de bens móveis por intermédio dessa modalidade negocial.

Assim, data venia dos entendimentos em contrário, tenho a firme convicção de que os fundamentos acolhidos pelo Pleno do Excelso Pretório se aplicam como luva ao caso em estudo. O leasing financeiro não alberga `prestação de serviço-. Não será por disposição legal que a sua natureza poderá sofrer alteração. A lei não tem o condão de modificar a essência das coisas ou dos fatos. Definir como prestação de serviço aquilo que essencialmente não o é, se traduz numa forma escamoteada de burlar a limitação constitucional de incidência tributária.

Sobre a impossibilidade de a lei tributária mudar o conceito dos institutos adotados, especialmente os de direito privado, para estabelecer a incidência dos tributos, se mostram pertinentes e absolutamente válidas as palavras do Ministro Luiz Gallotti, exaradas em voto vencido que proferiu no Recurso Extraordinário n. 71.758, e citadas pelo Ministro Octávio Gallotti, também no voto vencido que prolatou no Recurso Extraordinário n . 116.121-3, antes referido:

`Como sustentei muitas vezes, ainda no Rio, se a lei pudesse chamar de compra o que não é compra, de importação o que não é importação, de exportação o que não é exportação, de renda o que não é renda, ruiria todo o sistema tributário inscrito na Constituição (RTJ 66, p. 165)-.(sem grifo no original)
Em arremate, cumpre salientar que os termos da Súmula 138 do Superior Tribunal de Justiça, ante a nova orientação do Guardião Mor da Constituição da República, merecem ser revistos. Decompondo-se o contrato de leasing financeiro - financiamento, locação e opção de compra - resta indesviável a afirmação categórica de não-incidência do ISS. (sem grifo no original) Em relação ao primeiro dos elementos (financiamento) compete à União a instituição de tributos sobre operações financeiras (CF, art. 153, inc. V). No que diz respeito à locação, o item 79 da Lista de Serviços anexa ao Decreto-lei n. 406/68 mereceu censura do Supremo Tribunal Federal, lembrando novamente que o arrendamento mercantil foi guindado pela Lei Complementar n. 56/97 à condição de espécie do gênero `locação de bens móveis-. E por fim, a opção de compra, se concretizada, quando muito, ensejaria o pagamento atinente à circulação de mercadorias (no caso, em função do regime de substituição tributária o ICMS já foi pago antecipadamente)-.

Em relação ao primeiro dos elementos (financiamento) compete à União a instituição de tributos sobre operações financeiras (CF, art. 153, inc. V). No que diz respeito à locação, o item 79 da Lista de Serviços anexa ao Decreto-lei n. 406/68 mereceu censura do Supremo Tribunal Federal, lembrando novamente que o arrendamento mercantil foi guindado pela Lei Complementar n. 56/97 à condição de espécie do gênero -locação de bens móveis-. E, por fim, a opção de compra, se concretizada, quando muito, ensejaria o pagamento atinente à circulação de mercadorias (no caso, em função do regime de substituição tributária, o ICMS já foi pago antecipadamente).

Ainda que o pronunciamento do Supremo Tribunal Federal tenha sido incidental, não se pode negar o efeito que atinge as legislações inferiores, porque as decisões da Suprema Corte possuem caráter normativo, sem vinculação, é certo, mas normativo. Desse modo, as legislações inferiores que tratam da matéria e que devem obedecer às normas gerais editadas em lei complementar, nos termos do preconizado no art. 146 da Constituição Federal, sofrem de imediato os reflexos do julgamento que declarou inconstitucional a expressão -locação de bens móveis- constante da Lei Complementar n. 56/87, que deu redação ao Decreto-lei n. 406/68.

Embora o § 2° do art. 102 da Constituição Federal disponha sobre o efeito vinculante somente das decisões definitivas proferidas pelo Supremo Tribunal Federal nas ações declaratórias de constitucionalidade, não se afigura despropositado adotar como orientação jurisprudencial decisão sobre inconstitucionalidade proferida pelo plenário da Alta Corte. Afinal, se o julgamento se deu em Sessão Plenária, mesmo que não tenha sido proferido em ação declaratória de constitucionalidade, não há que se negar que a decisão expressa o entendimento que adotará doravante.- (Embargos Infringentes n.º 2004.001789-8)

Do substancioso estudo realizado pelo eminente par naquele voto infere-se o entendimento de que a Constituição Federal delimitou as hipóteses de incidência de modo que nem mesmo ao legislador complementar é permitida a tributação do ISS sobre atividade ou operação que não constitua efetivamente um -serviço-, o que, na definição buscada no âmbito do Direito Privado por imperatividade do art. 110 do Código Tributário Nacional, compreende apenas àquelas atividades que envolvem uma obrigação de fazer. 

Estabelecida tal premissa, tem-se que no leasing financeiro, que reúne componentes de compra e venda, locação e até de depósito, o que existe fundamentalmente é uma obrigação de dar, pois o máximo que poderia se admitir como -serviço- seria a elaboração do contrato e o respectivo desembaraço burocrático, no entanto, esse tipo de atividade se constitui meio para a alienação do bem móvel, seja por meio de compra e venda, seja por meio de leasing. 

Por conseguinte conclui-se que há um só tempo a legislação (federal e municipal) que prevê a incidência do ISS sobre as atividades de leasing financeiro é ilegal e inconstitucional, razão pela qual, no meu entender, deve ser prestigiada a tese esposada no voto condutor do acórdão embargado, considerando que, na sua composição anterior, este Colendo Grupo de Câmaras de Direito Público desta Corte tem vários julgados que, em sede de embargos infringentes tem seguido esta mesma trilha de entendimento, com a qual sempre compartilhei e continuo a compartilhar. 

A propósito, vide: EI n. 2005.016710-9, de Tubarão, EI n. 2004.007594-4, de Criciúma, ambos desta relatoria j., respectivamente, em 10/5/05 e 21/12/04; EI n. 2004.033260-0, de Itajaí, rel. Vanderlei Romer, j.09/02/05; EI n. 2005.005198-5, de Itajaí, j. 13/04/05, rel. Rui Fortes; EI n. 2004.032873-5, de Itajaí, rel. Des. Newton Trisotto, j. 01/02/06; EI n. 005.020945-2, de Tubarão, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j. 10.08.05; entre outros.

Por esses motivos dissenti da douta maioria e votei no sentido da tese jurídica de que não há incidência de ISS sobre as operações de arrendamento mercantil.

Florianópolis, 08 de novembro de 2006.

Nicanor da Silveira
RELATOR

 

Declaração de voto do Desembargador Luiz Cézar Medeiros
As razões de meu dissenso são as mesmas do eminente Desembargador Nicanor da Silveira.
Sobre a não aplicação da Súmula 138, acrescento os argumentos exarados em recente pronunciamento do Superior Tribunal de Justiça:

-TRIBUTÁRIO. ISS. ARRENDAMENTO MERCANTIL. OBRIGAÇÃO DE FAZER. CONCEITO PRESSUPOSTO PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. AMPLIAÇÃO DO CONCEITO QUE EXTRAVASA O ÂMBITO DA VIOLAÇÃO DA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL PARA INFIRMAR A PRÓPRIA COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA CONSTITUCIONAL. ACÓRDÃO CALCADO EM FUNDAMENTO SUBSTANCIALMENTE CONSTITUCIONAL. INCOMPETÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. TEMA DIVERSO DO ENSEJADOR DA SÚMULA 138, DO STJ.

-1. O ISS na sua configuração constitucional incide sobre uma prestação de serviço, cujo conceito pressuposto pela Carta Magna eclipsa ad substantia obligatio in faciendo, inconfundível com a denominada obrigação de dar.

-2. Outrossim, a Constituição utiliza os conceitos de direito no seu sentido próprio, com que implícita a norma do artigo 110, do CTN, que interdita a alteração da categorização dos institutos.

-3. Consectariamente, qualificar como serviço a atividade que não ostenta essa categoria jurídica implica em violação bifronte ao preceito constitucional, porquanto o texto maior a utiliza não só no sentido próprio, como também o faz para o fim de repartição tributária-constitucional (RE 116121/SP).

-4. Sob esse enfoque, é impositiva a regra do artigo 156, III, da Constituição Federal de 1988, verbis:
- `Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:
- `I - propriedade predial e territorial urbana;
- `II - transmissão `inter vivos-, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição;
- `III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993) (...)-

-5. A dicção constitucional, como evidente, não autoriza que a lei complementar inclua no seu bojo atividade que não represente serviço e, a fortiori, obrigação de fazer, porque a isso corresponderia franquear a modificação de competência tributária por lei complementar, com violação do pacto federativo, inalterável sequer pelo poder constituinte, posto blindado por cláusula pétrea.

-6. O conceito pressuposto pela Constituição Federal de serviço e de obrigação de fazer corresponde aquele emprestado pela teoria geral do direito, segundo o qual o objeto da prestação é uma conduta do obrigado, que em nada se assemelha ao dare, cujo antecedente necessário é o repasse a outrem de um bem preexistente, a qualquer título, consoante a homogeneidade da doutrina nacional e alienígena, quer de Direito Privado, quer de Direito Público.

-7. Envolvendo a atividade, bens e serviços, a realidade econômica que interessa ao Direito Tributário impõe aferir o desígnio final pretendido pelo sujeito passivo tributário, distinguindo-se a atividade meio, da atividade fim, esta última o substrato da hipótese de incidência.

-8. `A adulteração dos conceitos incorporados pelo Constituinte na criação da regra-matriz de incidência de cada exação fiscal é matéria constitucional, visto que viola as regras de repartição constitucional da competência tributária e, por conseqüência, atenta contra a organização federativa do Estado, que pressupõe a autonomia legislativa dos entes federados- (Parecer da lavra de Luiz Rodrigues Wambier, datado de 20.07.2006).

-9. As proposições acima conduzem à inequívoca inconstitucionalidade do item 79 e do subitem 15.09, da relação anexa ao Decreto-Lei 406/68, com a redação dada, respectivamente, pelas Leis Complementares 56/87 e 116/03, que prevêem a incidência do ISS sobre o arrendamento mercantil, por isso que se conjura a incompetência imediata do STJ para a análise de recurso que contenha essa antinomia como essência em face da repartição constitucional que fixa os lindes entre esta E. Corte e a Corte Suprema.

-10. Acórdão cuja conclusão alicerça-se em fundamento constitucional, qual seja, a violação do artigo 156, III, da Constituição Federal de 1988, e a inconstitucionalidade das listas constantes do Decreto-Lei 406/68 e da Lei Complementar 116/03, revela-se de integral competência do STF, máxime quando se sustenta um fundamento autônomo a exigir, na forma do verbete sumular, a interposição simultânea de ambos os apelos extremos (Precedentes da Primeira Turma: AgRg no REsp 684021/RS, desta relatoria, DJ de 22.08.2005; AgRg no Resp 697335/RS, desta relatoria, DJ de 29.08.2005; REsp 631547/MG, Relator Ministro José Delgado, DJ de 05.08.2004; e AgRg no AgRg no Ag 659539/MG, desta relatoria, DJ de 20.02.2006. Decisões monocráticas: RESP 628211/BA, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, DJ de 15.12.2004, e no REsp 822631/RS, Relator Ministro José Delgado, DJ de 31.03.2006).

11. Deveras, a conceituação de serviços encarta-se na mesma competência que restou exercida pela Corte Suprema na análise prejudicial dos conceitos de faturamento e administradores e autônomos para os fins de aferir hipóteses de incidência, mercê de a discussão travar-se em torno da legislação infraconstitucional que contemplava essas categorizações, reproduzindo as que constavam do texto maior.

-12. Aliás não é por outra razão que o CPC dispõe no artigo 543 que: 
" `Art. 543. Admitidos ambos os recursos, os autos serão remetidos ao Superior Tribunal de Justiça. (...)
- `§ 2º Na hipótese de o relator do recurso especial considerar que o recurso extraordinário é prejudicial àquele, em decisão irrecorrível sobrestará o seu julgamento e remeterá os autos ao Supremo Tribunal Federal, para o julgamento do recurso extraordinário. (...)-

-13. A Súmula 138, do E. STJ, não se aplica in casu, por isso que, analisando sua ratio essendi e os arestos que lhe serviram de gênese, inafastável concluir que a mesma foi editada para o fim de defender-se a aplicação do Decreto-Lei 406/68, após a edição da Lei Complementar 56/87, porquanto, anteriormente, a tributação municipal do leasing era engendrada via aplicação analógica do primeiro diploma legal. Nada obstante, em nenhuma passagem dos arestos geradores da súmula restou posta a questão constitucional ora enfrentada.

-14. Sobressai, desta sorte, imprescindível a manifestação da Corte Suprema sobre o thema iudicandum, suscitado de forma explícita ou implícita em todas as causas que versam sobre a competência tributária municipal, essência manifesta das decisões que tem acudido ao E. STJ.

-15. In casu, o aresto objurgado decidiu que: `APELAÇÃO. ARRENDAMENTO MERCANTIL. ISS. INEXIGIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. A inclusão na Lista de Serviço de fatos que não configuram prestação de serviço, por afastada a idéia de trabalho, de esforço humano, de um `facere-, afronta o disposto no artigo 156, III da Constituição Federal. Assim se dá na locação de bens móveis, como já proclamou o Supremo Tribunal Federal. Assim também e por identidade de razões no arrendamento mercantil. É que não importa esteja listado o serviço; importa, sim, se o fato que lá está descrito se caracteriza como tal. A Lista não é critério ou não é o único critério para descrever o fato gerador do ISS, até porque não define o tipo, não conceitua o que seja prestação de serviço. É ou ao menos deveria ser exemplificativa, jamais definidora do tipo. Na verdade, a noção de serviço, traço essencial do ISSQN, não dispensa e idéia de trabalho, de esforço humano, tal como disciplinado no Código Civil, ao qual há de socorrer-se o intérprete em obediência ao que dispõe o artigo 110 do CTN, ante o vazio normativo tributário. Apelo provido- (Apelação Cível nº 70009640657, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Relator Desembargador Genaro José Baroni Borges, Julgado em 03.11.2004).

-16. As conclusões e premissas de índole notadamente constitucional, sem as quais não sobreviveria o aresto recorrido impõem timbrar seu fundamento constitucional para, na forma da jurisprudência cediça na Corte, não conhecer do especial (Precedentes: AgRg no Ag 757416/SC, Relator Ministro José Delgado, Primeira Turma, DJ de 03.08.2006; AgRg no Ag 748334/SP, Relatora Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, DJ de 30.06.2006; REsp 754545/RS Ministro Franciulli Netto, Segunda Turma, SEGUNDA TURMA DJ 13.03.2006; AgRg no REsp 778173/MG, Relator Ministro José Delgado, Primeira Turma, DJ de 06.02.2006; AgRg no REsp 658392/DF, Relator Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, DJ de 21.03.2005).

-17. Recurso especial não conhecido, divergindo-se do voto do relator- (REsp 805317, Min. Luiz Fux, j. 17.8.2006) (Grifou-se).

Em arremate, cumpre salientar que os termos da Súmula 138 do Superior Tribunal de Justiça, ante a nova orientação do Guardião Mor da Constituição da República, merecem ser revistos. Decompondo-se o contrato de leasing financeiro - financiamento, locação e opção de compra - resta indesviável a afirmação categórica de não-incidência do ISS. Em relação ao primeiro dos elementos (financiamento) compete à União a instituição de tributos sobre operações financeiras (CF, art. 153, inc. V). No que diz respeito à locação, o item 79 da Lista de Serviços anexa ao Decreto-lei n. 406/68 mereceu censura do Supremo Tribunal Federal, lembrando novamente que o arrendamento mercantil foi guindado pela Lei Complementar n. 56/97 à condição de espécie do gênero -locação de bens móveis-. E, por fim, a opção de compra, se concretizada, quando muito, ensejaria o pagamento atinente à circulação de mercadorias (no caso, em função do regime de substituição tributária, o ICMS já foi pago antecipadamente).

Por esses motivos dissenti da douta maioria e votei pela não incidência do ISS sobre operações de leasing financeiro.

Florianópolis, 13 de dezembro de 2006.

Luiz Cézar Medeiros

Declaração de voto vencido do Exmo. Sr. Des. Vanderlei Romer:
Dissenti da douta maioria, num primeiro momento, porque convicto de que o incidente de uniformização de jurisprudência deveria ser sobrestado até o enfrentamento da matéria sub judice pelo Pretório Excelso e, num segundo momento, pelo fato de esposar o entendimento de que o ISS não incide sobre as operações de arrendamento mercantil financeiro. 

Quanto ao primeiro aspecto, nada tenho a acrescentar ao judicioso voto vencido do eminente Desembargador Nicanor da Silveira.

No que concerne à questão jurídica ora em debate, em que pese o entendimento ditado nesta sessão pelos meus nobres pares, é sabido e consabido que este colendo Grupo de Câmaras de Direito Público, em diversas oportunidades, proclamou a inexigibilidade do tributo em tela, uma vez que as operações de leasing não englobam a prestação de serviços necessária à sua incidência, orientação firmada a partir do julgamento proferido nos Embargos Infringentes n. 2004.001789-8, de relatoria do ilustre Desembargador Luiz Cézar Medeiros, julgados em 12-5-2004. No mesmo sentido, confira-se: EI n. 2004.033260-0, de minha relatoria, j. 9-2-2005; EI n. 2004.007594-4, rel. Des. Nicanor da Silveira, j. 13-12-2004; EI n. 2004.005150-6, rel. designado Des. Newton Trisotto, j. 8-9-2004; dentre outros. 
É bem verdade que o Superior Tribunal de Justiça havia pacificado a divergência jurisprudencial com a edição da Súmula 138, a saber: -O ISS incide na operação de arrendamento mercantil de coisas móveis-. Todavia, em decisão posterior, o Supremo Tribunal Federal posicionou-se pela não-incidência do ISS nos contratos de locação de coisas móveis (RE n. 116.121/SP, rel. Min. Marco Aurélio). Assim, o entendimento consagrado pelo enunciado da mencionada súmula foi modificado, consoante pode ser observado nos recentes julgados desta Corte. 

Desse modo, a incidência do ISS sobre operações de leasing, prevista no item 79 da relação anexa ao Decreto n. 406/68 e no item 15.09 do novo rol constante da LC n. 116/2003, diz respeito exclusivamente à modalidade de leasing operacional ou às atividades do agente financeiro que possam efetivamente ser enquadradas como prestação de serviços e já não estejam sujeitas ao Imposto sobre Operações Financeiras.

Florianópolis, 8 de novembro de 2006.

VANDERLEI ROMER