Embargos Infringentes n. 2007.016496-5 da Capital

Relator: Des. Rui Fortes.

EMBARGOS INFRINGENTES - TRIBUTÁRIO - ICMS - ENERGIA ELÉTRICA - DEMANDA DE POTÊNCIA - BASE DE CÁLCULO - CONSUMO EFETIVO (KWH) E DEMANDA UTILIZADA (KW), AFERIDOS NOS RESPECTIVOS MEDIDORES - MATÉRIA SUMULADA NESTA CORTE - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
Incide ICMS tão-somente sobre os valores referentes à energia elétrica consumida (kWh) e à demanda de potência efetivamente utilizada (kW), aferidas nos respectivos medidores, independentemente do quantitativo contratado.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Embargos Infringentes n. 2007.016496-5, da comarca da Capital (Unidade da Fazenda Pública), em que é embargante Unimed de Joinville Cooperativa de Trabalho Médico, e embargado o Estado de Santa Catarina:
ACORDAM, em Grupo de Câmaras de Direito Público, por votação unânime, dar provimento parcial ao recurso.
Custas na forma da lei.
I - RELATÓRIO
A Unimed de Joinville Cooperativa de Trabalho Médico, inconformada com a decisão da Segunda Câmara de Direito Público que, por maioria de votos, deu provimento ao recurso de apelação interposto pelo Estado de Santa Catarina (fls. 157 a 163) para julgar improcedente pedido que tem por objetivo declarar a inexigibilidade da incidência do ICMS sobre o valor total da demanda contratada de energia elétrica, bem como a restituição dos valores cobrados indevidamente nos últimos 5 (cinco) anos, interpôs recurso de embargos infringentes, destacando que, na espécie, deve prevalecer o voto vencido proferido pelo eminente Des. Substituto Jaime Ramos (fls. 164 a 171), o qual reconheceu a ilegalidade da base de cálculo do referido tributo. Sustentou que a decisão impugnada encontra-se em manifesto confronto com o entendimento firmado nesta colenda Corte e no Superior Tribunal de Justiça, pois entende que o ICMS deve incidir apenas sobre o consumo efetivo de energia elétrica, e não sobre o valor total da demanda de potência contratada com a CELESC. Disse que, na contratação do serviço de fornecimento de energia elétrica, não há circulação de mercadoria, a qual ocorre apenas quando há o efetivo consumo. Por fim, após outras considerações, rogou pela reforma da decisão colegiada para que sejam restabelecidos os efeitos da decisão proferida no primeiro grau de jurisdição (fls. 175 a 188).
Apresentadas as contra-razões (fls. 193 a 200), o feito foi redistribuído na forma do art. 534 do CPC (fl. 202).
II - VOTO
Cuida-se de embargos infringentes em que o núcleo da querela está centrado na análise da legalidade ou não da incidência do ICMS sobre o valor total da demanda contratada de energia elétrica, ou apenas sobre a energia efetivamente consumida pelo contratante, e, caso procedente a segunda hipótese, seja determinada a devolução dos valores cobrados indevidamente nos últimos 5 (cinco) anos que antecederam o ajuizamento da presente ação.
Com razão parcial a recorrente.
A matéria não é nova nesta colenda Corte, que, alicerçada em decisões do Superior Tribunal de Justiça, vem decidindo que o valor integral da demanda contratada de energia elétrica não integra a base de cálculo do ICMS, porque não há circulação de mercadoria, devendo o referido tributo incidir apenas sobre o efetivo consumo de energia, e sobre eventual excesso que circular acima dos limites contratados com a CELESC (demanda de ultrapassagem).
Muito embora a Segunda Câmara de Direito Público viesse decidindo de forma contrária, tal divergência deixou de existir na sessão realizada no dia 11 de julho do corrente ano, quando, em incidente de uniformização de jurisprudência, este egrégio Grupo de Câmaras sumulou a matéria (súmula publicada na data de hoje), que tem o seguinte preceito:
-Súmula 21: Incide ICMS tão-somente sobre os valores referentes à energia elétrica consumida (kWh) e à demanda de potência efetivamente utilizada (kW), aferidas nos respectivos medidores, independentemente do quantitativo contratado-.
Em que pese a semelhança existente entre o teor da referida súmula e o que já decidiam as Primeira e Terceira Câmaras de Direito Público, novas considerações sobre a matéria foram trazidas à baila, porque equívocos na interpretação dos julgados deste Tribunal autorizava contribuintes a eximirem-se do pagamento de parte do ICMS incidente sobre o total da energia elétrica consumida.
Nesse sentido, as considerações feitas pelo eminente Des. Luiz Cézar Medeiros, na data de hoje, quando da publicação da súmula que pacificou a matéria neste colendo Grupo de Câmaras, in verbis:
-Pelas definições constantes do art. 2º da Resolução n. 456/2000 da ANEEL - Agência Nacional de Energia Elétrica e das disposições elencadas no art. 49 do mesmo Diploma, e ainda com supedâneo no art. 11 do Decreto n. 62.724/68, as tarifas de energia elétrica aplicadas aos consumidores do Grupo `A- - industriais e comerciais -, com tensão de fornecimento igual ou superior a 2,3 kV, são estruturadas na forma binômia, com um componente de `demanda de potência- e outro de `consumo de energia-. Assim, uma parcela do preço pelo fornecimento de energia elétrica se refere à `demanda de potência- e outra parcela diz respeito ao `consumo de energia-
-Impende seja salientado que, tanto a `demanda de potência-, quanto o `consumo de energia- são aferidos por aparelhos medidores. Desse modo, por meio de equipamentos próprios instalados na unidade consumidora são registrados os quantitativos de `demanda de potência- efetivamente utilizada (kW) e de `energia elétrica- consumida (kWh).
-Conclui-se, portanto, que todo usuário de energia que esteja enquadrado no Grupo `A-, ao receber sua fatura de energia elétrica tem conhecimento do quantitativo utilizado (medido) tanto de `demanda de potência- quanto de `consumo de energia-.
-Desse modo, para se determinar o quantitativo de demanda de potência contratada não utilizada basta verificar na própria Nota Fiscal Fatura de Energia Elétrica, pois esta, no campo próprio, indica: (a) a demanda medida (utilizada no período de medição); (b) a demanda contratada; (c) a demanda faturada e (d) a demanda ultrapassada. Vale ressaltar que a demanda faturada em regra será igual ao quantitativo de kW contratado, haja ou não a efetiva utilização. 
-Assim, quando o quantitativo contratado não é totalmente utilizado constará na fatura o número de kW medido, o contratado e o faturado, que corresponderá a este último. Se houver utilização maior do que a prevista no contrato, o quantitativo excedente será cobrado com preço diferenciado a título de `demanda de ultrapassagem-.
-Como se verá mais adiante, é exatamente sobre a diferença entre a potência de demanda contratada e a efetivamente utilizada que não incidirá o ICMS.
-Em resumo, sendo a demanda de potência, utilizada pelos consumidores industriais e comerciais, objeto de medição por equipamento específico e os quantitativos aferidos informados no documento fiscal, forçosamente tem ela que integrar a base de cálculo do ICMS.
-2. O tecnicismo próprio da matéria tem levado a equívocos, pois os vários precedentes desta Corte, de outros Tribunais, e do próprio Superior Tribunal de Justiça, ao enaltecer que o ICMS só incide sobre a `energia efetivamente consumida-, deixou ao desabrigo a `demanda de potência- efetivamente utilizada, como se fosse um produto dissociado daquela. 
-Aproveitando-se do fato de que nem sempre os julgados são suficientemente claros a respeito da composição `binômia- da tarifa de energia elétrica, os contribuintes têm conseguido interpretações incorretas que acabam afastando a incidência de ICMS, inclusive, da `demanda de potência- efetivamente utilizada, expressão técnica daquilo que se entende coloquialmente por `efetivamente consumida-.
-Na verdade o correto seria dizer, sem apego ao formalismo técnico, que o ICMS incide sobre o consumo efetivo de `energia elétrica- e de `demanda de potência-, ficando a descoberto da exação somente a diferença entre o quantitativo de demanda contratado e o realmente utilizado.
-3. Embora a expressão já tenha constado na argumentação precedente, como é sabido, a demanda de potência, por ser objeto de contrato, também é denominada de `demanda contratada-. Porém, ao ser realizado esse objeto do contrato, o que ocorre mensalmente, o usuário passará a `consumir- - o termo tecnicamente correto é `utilizar- - a potência ajustada. Essa utilização, como esclarecido, é quantificada em medidor específico instalado na unidade consumidora, determinando com exatidão quanto da potência contratada saiu da rede da empresa distribuidora e entrou nas instalações da empresa consumidora.
-Assim, se por força do contrato a distribuidora de energia elétrica cobra o correspondente ao valor total do quantitativo contratado, a incidência do ICMS só se dará sobre o valor da `demanda de potência- efetivamente fornecida, ou melhor, utilizada.
-A bem da verdade, esclarecida tecnicamente a questão do binômio compositivo da tarifa de energia elétrica para os consumidores do Grupo `A- - demanda de potência utilizada + energia consumida -, com a adoção de interpretação adunada a esses conceitos técnicos e jurídicos, principalmente ante o entendimento pacificado de que sobre `o não consumido- e `o não utilizado- não incide o ICMS, verifica-se que os precedentes que fundamentam o entendimento desta Corte de Justiça continuam sendo aplicáveis. Basta que reste claro que apenas sobre o valor concernente à demanda de potência não utilizada é que não incidirá o tributo em questão-.
Dessa forma, verificado que a incidência do ICMS, no caso de consumo de energia elétrica e quando há contração específica (demanda de potência), se dá sobre a energia consumida (kWh) e sobre a demanda de potência efetivamente utilizada (kW), forçoso reconhecer que o referido tributo incide tão-somente sobre os valores aferidos nos respectivos medidores, independentemente do quantitativo contratado com a CELESC.
Ante o exposto, dá-se provimento parcial ao recurso para reconhecer a não-incidência do ICMS apenas sobre o quantitativo da demanda de potência contratada mas não utilizada, bem como acolher o pedido de restituição dos valores cobrados indevidamente nos últimos 5 (cinco) anos que antecederam o ajuizamento da ação.
III - DECISÃO
Nos termos do voto do Relator, decidiu o Grupo de Câmaras de Direito Público, por votação unânime, dar provimento parcial ao recurso.
Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Des. Cesar Abreu, Cid Goulart, Francisco Oliveira Filho (Presidente), Orli Rodrigues, Volnei Carlin, Luiz Cézar Medeiros, Vanderlei Romer e Sérgio Roberto Baasch Luz.
Florianópolis, 8 de agosto de 2007.

Rui Fortes
RELATOR