Os limites da linguagem jurídica

O processo neológico - criação de palavras e expressões - existe na linguagem jurídica, podendo acontecer por meio do neologismo semântico, do neologismo por empréstimo, do neologismo por composição e do neologismo formal, os quatro em maior ou menor quantidade dentro do nosso universo forense.

Tal processo se dá, principalmente, pela necessidade em diversificar o repertório vocabular, com o objetivo de evitar a repetição de verbetes no texto.

Ainda que isso seja possível, invariavelmente nos deparamos com alguns termos que são fruto de uma imaginação muito fértil, mas que nem sempre evidenciam a devida cautela com a nossa estimada língua portuguesa.

Assim como no mundo corporativo surgiu a brilhante tradução do inglês e propagou-se a expressão "vamos estar fazendo...", no universo jurídico não é diferente. O resultado é deveras desaminador: o empobrecimento do idioma.

Comecemos com o termo "flagranteado". No português, existe o verbo flagrar, mas também existe o adjetivo flagrante. Contudo, em alguns julgados e outras peças processuais não é raro encontrar o termo flagranteado para especificar aquele que sofreu a prisão em flagrante. Nesse caso, repetiu-se a ideia dos demais termos usados no particípio que servem como adjetivo: executado (executar), requerido (requerer), demandado (demandar). Claramente, tal especificação foi uma tentativa de proporcionar uma variação aos termos segregado (segregar), preso (prender), investigado (investigar).

No entanto, a derivação deu-se de adjetivo para adjetivo, enquanto nos demais casos trata-se de uma criação a partir de um verbo, de modo que o termo flagranteado supõe a existência do verbo flagrantear. E, sabendo que referido verbo não existe, a palavra flagranteado nada mais é do que uma invenção que não deveria ser reproduzida.

Elaboração: Patrícia Corazza

Fonte:
VOLP (Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa)