Infância conectada: os desafios da proteção digital nos 35 anos do ECA - Imprensa - Poder Judiciário de Santa Catarina
Brasil é o segundo país do mundo com maior número de casos de cyberbullying
Trinta e cinco anos após a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), os direitos da infância e juventude seguem desafiados por novas ameaças. Se no passado a proteção exigia vigilância nos espaços físicos, hoje ela precisa se estender ao ambiente digital, um território mais difícil de delimitar.
A exposição precoce e sem supervisão à internet tem deixado crianças e adolescentes vulneráveis a crimes como aliciamento, stalking, assédio sexual, jogos perigosos, compartilhamento indevido de imagens e até incentivos ao suicídio. Para se ter uma ideia, o Brasil é o segundo país do mundo com maior número de casos de cyberbullying, conforme levantamento do Instituto Ipsos.
Outro ponto preocupante, segundo a assistente social Cristine Pereira Tuon Sposito, da Coordenadoria Estadual da Infância e Juventude (CEIJ), do TJSC, é o aliciamento de crianças e adolescentes por meio de plataformas digitais usadas para jogos. “É por esses canais que muitos aliciadores têm se aproximado do público infantojuvenil”, afirma.
Levantamento da ONG SaferNet Brasil aponta que foram mais de 71 mil denúncias de abuso sexual infantil online em 2023 — um aumento de 77% em relação ao ano anterior. “Você deixaria seu filho brincar sozinho em uma praça da cidade? A internet é a maior praça pública do planeta, e as crianças e adolescentes precisam da orientação, da supervisão dos pais e dos responsáveis”, alertou Rodrigo Nejm, diretor de educação na SaferNet Brasil, em palestra no TJSC.
A desembargadora Rosane Portella Wolff, coordenadora da CEIJ, destaca que proteger exige vigilância constante. “É essencial que os pais estejam atentos a sinais como ansiedade, isolamento, agressividade, alterações no sono, mudanças no apetite e queda no rendimento escolar. Também é importante orientar sobre privacidade, estabelecer limites para o uso de dispositivos, instalar filtros de conteúdo e denunciar qualquer suspeita às autoridades competentes. E, sempre e acima de tudo, estimular o diálogo aberto e franco”, reforça.
Programa da Justiça catarinense
Para enfrentar esse cenário, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina, por meio da CEIJ e do Núcleo de Inteligência e Segurança Institucional (NIS), desenvolveu o programa Conhecer para se Proteger, com ações educativas, preventivas e de combate aos crimes praticados no ambiente digital.
Lançado em 2019, o programa entrou numa nova fase em abril deste ano e será levado a 30 municípios catarinenses, com foco em estudantes do 1º e 2º ano do ensino médio da rede pública. A expansão reforça o compromisso das instituições em articular esforços contra a violência digital. Magistrados, servidores, professores e agentes de segurança pública atuam juntos na execução do projeto.
“As parcerias são a solução para os nossos males. Cada um tem de contribuir com aquilo que pode para que cheguemos a um denominador comum e a um bom caminho”, afirma o presidente em exercício do TJSC, desembargador Cid Goulart.
A médica e ativista catarinense Zilda Arns dizia que “as crianças, quando bem cuidadas, são sementes de paz e esperança”. E esse cuidado com a infância, seja onde for, precisa ser coletivo — e atualizado todos os dias. É o que estabelece o artigo 227 da Constituição Federal e o ECA: é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, seus direitos fundamentais.