Seminário discute as diferenças, semelhanças e desafios dos Judiciários brasileiro e português - Imprensa - Poder Judiciário de Santa Catarina
Ao iniciar suas considerações no Seminário de Direito Comparado Brasil-Portugal, o desembargador José Igreja Matos impressionou a plateia presente ao auditório Jurista Paulo Henrique Blasi, na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), com a informação de que uma média de 100 processos tramitam por ano na Corte que preside, o Tribunal da Relação do Porto.
Uma situação muito diferente da vivenciada por magistrados e servidores do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), que hoje recebe 30 mil novos processos a cada mês. As diferenças e semelhanças entre o Poder Judiciário português e o brasileiro foram debatidas no seminário, realizado na tarde desta segunda-feira, 4 de agosto.
“É realmente extraordinário, 100 recursos por ano. É incomparável em termos de escala aquilo que se faz em Portugal e aquilo que se faz no Brasil”, frisou o palestrante. José Matos explicou como se estruturam as instâncias da Justiça no país europeu, que tem a separação entre jurisdição comum e jurisdição administrativa.
O Tribunal da Relação do Porto é antigo – de 1581 – e equivale em Portugal aos Tribunais de Justiça estaduais brasileiros. Conta com 104 desembargadoras e desembargadores divididos nas secções cíveis e criminais, além das secções especializadas – uma do comércio e outra do trabalho. Os desembargadores não contam com assessores, e o tribunal tem 44 servidores.
Um destaque é a participação feminina: as desembargadoras são hoje metade da corte do Porto e 64% dos magistrados de Portugal. “Até 25 de abril de 1974, Portugal vivia numa ditadura, e era proibido uma mulher ser juíza. E só em 1977, com a nomeação de Ruth Garcês, o país teve sua primeira magistrada”, observou o palestrante.
Entre os assuntos debatidos estavam o uso da inteligência artificial (IA) no Judiciário e a regulamentação das redes sociais. “É um tema decisivo. Entendo que nós juristas não temos sido ouvidos, nem temos tido o protagonismo que deveríamos ter. Há necessidade de regulamentação clara. As redes sociais influenciam eleições, condicionam o poder burocrático. A União Europeia, em uma boa hora, resolveu começar este processo de regulamentação”, analisou.
O presidente do Tribunal da Relação do Porto acumula uma destacada trajetória no cenário internacional da magistratura. Foi presidente da União Internacional de Magistrados (UIM), que reúne associações nacionais de juízes de 94 países, entre 2021 e 2023. Foi também presidente da Associação Europeia de Juízes entre 2016 e 2020.
Atualmente, integra o Conselho Consultivo da Rede Global de Integridade Judicial das Nações Unidas e é vice-presidente do Conselho Consultivo dos Juízes Europeus (Conselho da Europa). É autor de várias dezenas de livros, artigos e estudos sobre o poder judicial, incluindo um Manual Luso-Brasileiro de Gestão de Tribunais.
Componente da mesa de debates, o vice-diretor-executivo da Academia Judicial do TJSC, desembargador Marcos Fey Probst, colocou como fundamental a troca de experiências e o amplo diálogo sobre o direito e as complexas relações da sociedade contemporânea. “Muitos dos temas e aflições por nós vivenciados foram e estão sendo objeto de ponderação e normatização por países, a exemplo da regulamentação das redes sociais pela comunidade europeia e da própria migração dos povos – temas de primeira ordem”, complementou.
Em suas considerações finais, o presidente do TJSC, desembargador Francisco Oliveira Neto, lembrou que o Poder Judiciário no Brasil está ainda em um processo de construção, que passa pela confiança da sociedade no que diz respeito à desjudicialização e aos mecanismos alternativos de solução de conflitos.
“Precisamos disso – de tempos de reflexão, de nos dedicar a ouvir e aprender. A experiência do desembargador José Matos, a sua visão de magistratura e de mundo, expressada nos diversos órgãos e organismos em que participa, são de grande valia. A união e a percepção das nossas similitudes são fundamentais. Há uma efetiva repetição das dificuldades que surgem, mas também fica clara a necessidade de manter a independência do Poder Judiciário, a compreensão de que o sistema judicial forte é representativo do Estado Democrático de Direito”, finalizou.
Organizado pela Academia Judicial, o seminário buscou aprofundar o diálogo institucional entre os sistemas de justiça do Brasil e de Portugal, além de promover o intercâmbio de conhecimentos. Na mesa de abertura, estiveram presentes ainda o desembargador Hélio do Valle Pereira; o desembargador aposentado Salim Schead dos Santos, 2º vice-presidente da Associação dos Magistrados Catarinenses (AMC); e o diretor de ensino da Escola Superior da Magistratura do Estado de Santa Catarina (Esmesc), Reny Baptista Neto – o desembargador José Matos é o palestrante convidado da aula magna que abre o semestre da Esmesc na próxima sexta-feira, 8 de agosto.
Também prestigiaram o seminário desembargadoras e desembargadores do TJSC, magistrados, estudantes, professores e servidores.
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