Conflito de Competência n. 2005.041487-1 de Joinville


Relator: Desembargador Substituto Jaime Ramos.


PROCESSUAL CIVIL - CONFLITO DE COMPETÊNCIA - RELEVANTE QUESTÃO DE DIREITO - DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL - SUSPENSÃO DO JULGAMENTO E SUBMISSÃO DA MATÉRIA AO GRUPO DE CÂMARAS DE DIREITO PÚBLICO - EXEGESE DO ART. 555, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC.


Vistos, relatados e discutidos estes autos de Conflito de Competência n. 2005.041487-1, da comarca de Joinville, em que é Suscitante o Juízo de Direito da 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Joinville e suscitado o Juízo de Direito da 4ª Vara Cível de Joinville:


ACORDAM, em Segunda Câmara de Direito Público, por votação unânime, suspender o julgamento e, nos termos do art. 555, parágrafo único, do Código de Processo Civil, submeter a matéria a julgamento pelo Grupo de Câmaras de Direito Público.


Custas legais.


I - RELATÓRIO:

Na Comarca de Joinville, a ENGEPASA AMBIENTAL LTDA. ajuizou -AÇÃO DE COBRANÇA (Rito Sumário)- contra Adão de Campos e outros, pleiteando valores referentes à tarifa de limpeza urbana, relativa ao ano de 2004, bem como de coleta e destinação final de resíduos domiciliares concernente ao ano de 2005, com os acréscimos legais, com base no contrato de concessão de serviços públicos n. 378/2002, firmado entre a autora e o Município de Joinville, e nos Decretos Municipais nºs 11.541/03, 12.172/04 e 12.252/05.


A MM. Juíza de Direito Substituta em exercício na 4ª Vara Cível, a quem o feito foi distribuído, declarou-se incompetente para conhecer e julgar a ação de cobrança, sob o fundamento de que a tarifa de limpeza urbana e de coleta de lixo tem caráter tributário, ensejando a aplicação do disposto no art. 1º, inciso III, da Resolução n. 06/2005-TJ, o que foi ratificado pelo digno Magistrado titular daquela unidade jurisdicional.


Remetidos os autos ao Juízo da 2ª Vara da Fazenda Pública, este suscitou conflito negativo de competência, ao argumento de que a competência absoluta, no caso, é da 4ª Vara Cível, sobretudo porque a pretensão diz respeito à cobrança de preço público, por pessoa jurídica de direito privado, que não goza das prerrogativas da Fazenda Pública.
A douta Procuradoria-Geral da Justiça opinou pelo conhecimento do conflito para declarar-se competente o Juízo Suscitante.


II - VOTO:

Cuida-se de conflito negativo de competência entre o Juízo de Direito da 4ª Vara Cível da Comarca de Joinville e o Juízo de Direito da 2ª Vara da Fazenda Pública daquela Comarca, em relação à ação de cobrança proposta por empresa concessionária do serviço público de coleta de lixo e de limpeza urbana, diante do não pagamento de tarifas, pelo usuário.


A 4ª Vara Cível da Comarca de Joinville foi criada pela Lei Estadual n. 6.899, de 05.12.1986, que assim definiu a competência das quatro Varas Cíveis daquela Comarca:


-Art. 8º A comarca de Joinville passa a ter oito juizes, servindo estes na 1ª, 2ª, 3ª e 4ª Varas Cíveis, 1ª e 2ª Varas Criminais, Vara da Família e Menores e Juiz Especial.


-§ 1º As atribuições das varas cíveis serão exercidas por distribuição, cabendo privativamente ao juízo da 1ª Vara os mandados de segurança; ao da 2ª Vara os registros públicos; e ao da 3ª Vara os feitos da Fazenda e acidentes do trabalho.


-§ 2º As varas criminais também terão atribuições exercidas por distribuição, cabendo à 1ª Vara a presidência do Tribunal do Júri com o processamento dos feitos respectivos.


-§ 3º À Vara da Família e Menores compete as atribuições dos artigos 96, 97, 98 e 101 do Código Judiciário.


-§ 4º As atribuições do Juiz Especial serão determinadas pelo Presidente do Tribunal.-
Portanto, a 4ª Vara Cível da Comarca de Joinville tem competência genérica para causas cíveis., sem qualquer matéria privativa.


Foi o Código de Divisão e Organização Judiciárias do Estado de Santa Catarina instituído pela Lei Estadual n. 5.624, de 09.11.1979, ainda em vigor, nessa parte, que no art. 94 estipulou a competência dos Juízes de Direito, na área cível:


-Art. 94. Compete ao juiz de direito, no cível e no comércio:

-I - processar e julgar:

-a) os feitos de jurisdição contenciosa ou voluntária, de natureza civil ou comercial, e os correlatos processos cautelares ou de execução;


-b) os feitos concernentes à comunhão de interesses entre portadores de debêntures e ao cancelamento de hipotecas em garantia destas;


-c) embargos de declaração às suas sentenças, nos termos do item II do art. 463 do Código de Processo Civil;


-II - suspender ou sobrestar o curso de ação civil, nos casos do parágrafo único do art. 64 do Código de Processo Penal e art. 110 do Código de Processo Civil;


-III - homologar as decisões arbitrais;


-IV - liquidar e executar, para fins de reparação de danos, a sentença criminal condenatória-.


Por sua vez, a 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Joinville foi criada pelo art. 1º, inciso IV, da Lei Complementar Estadual n. 224, de 10.01.2002, sem, no entanto, definir a competência. Esta haveria de ser fixada por Resolução do Tribunal de Justiça (art. 5º).


Por meio, então, da Resolução n. 06/2005-TJ, este Tribunal de Justiça definiu a competência da mencionada Vara:


-Art. 1º. Em decorrência desta Resolução:


-(...)


-III - na comarca de Joinville:

-a) cria-se a 2ª Vara da Fazenda Pública, com competência privativa para processar e julgar execuções fiscais de qualquer origem e natureza, ações de Direito Tributário - inclusive mandado de segurança, habeas data, ação popular e ação civil pública referentes a atividade estatal de tributar - e causas provenientes desses feitos-.


Em caso absolutamente idêntico ao presente, esta Segunda Câmara de Direito Público, em 11/04/2006, julgando o Conflito de Competência n. 2005.041479-2, da Comarca de Joinville, por acórdão da lavra do eminente Desembargador Francisco Oliveira Filho, decidiu, por votação unânime, que a competência é do Juízo de Direito da 4ª Vara Cível daquela Comarca.


O acórdão restou assim ementado:


-CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA - AÇÃO DE COBRANÇA - TARIFA DE LIMPEZA URBANA - SERVIÇO PÚBLICO PRESTADO POR CONCESSIONÁRIA - PREÇO PÚBLICO - NATUREZA NÃO TRIBUTÁRIA - SITUAÇÃO ESPECÍFICA DECORRENTE DA RESOLUÇÃO N. 06/05-TJSC - EXEGESE - COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITADO.


-Dispondo a Resolução n. 06/05 do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, a qual disciplina a competência de varas criadas pela Lei Complementar n. 224, de 10 de janeiro de 2002, em seu `art. 1º, inciso III - na comarca de Joinville: a) cria-se a 2a Vara da Fazenda Pública, com competência privativa para processar e julgar execuções fiscais de qualquer origem e natureza, ações de Direito Tributário - inclusive mandado de segurança, habeas data, ação popular e ação civil pública referentes a atividade estatal de tributar - e causas provenientes desses feitos-, não se pode deixar de lado que -A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que não se trata de tributo, mas de preço público, a cobrança a título de água e esgoto- (RE-ED n. 447536/SC, Min. Carlos Velloso, j. 28.6.05).


-E mais: `Fixada a distinção entre taxa e tarifa pelo critério da natureza do serviço e não apenas pelo da compulsoriedade dele, o serviço público divisível, específico e compulsório de coleta de lixo será remunerado por taxa, se for prestado diretamente pelo poder público; e por tarifa (ou preço público), se delegável e for prestado por concessionária, mesmo que obrigatória a adesão do usuário. `Logo, impossível negar-se à concessionária prestadora do serviço a legitimidade para cobrar a contraprestação pela coleta do lixo- (Ap. Cív. n. 00.011480-4, de Balneário Camboriú, Rel. Des. Volnei Carlin)- (Ap. Cív. n. 04.006011-4, de Balneário Camboriú, Des. Jaime Ramos, j. 13.9.05).


-AINDA: `A partir do momento em que o serviço público passa a ser prestado por uma concessionária, a forma da respectiva remuneração transmuda-se em tarifária (preço público), como é da essência dos serviços concedidos a teor do que dispõe o art. 175, II, da Lex Mater, até porque, ao se afirmar que determinado serviço só pode ser remunerado mediante taxa, se está, concomitantemente, negando-lhe a possibilidade de ser concedido- (Ap. Cív. n. 04.032038-2, relator o mesmo deste feito).


-Em face da especificidade da Resolução n. 06/05 do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, que disciplina a competência de varas criadas pela Lei Complementar n. 224, de 10 de janeiro de 2002, na hipótese a competência é do juízo suscitado, por se tratar de serviço prestado mediante concessão-.
Em contrário, no Conflito de Competência n. 2005.041490-5, de Joinville, relatado pelo eminente Des. Volnei Carlin, a Primeira Câmara de Direito Público decidiu que a competência é da Vara da Fazenda Pública:


-CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA - VARA DA FAZENDA PÚBLICA E VARA CÍVEL - TAXA DE LIMPEZA URBANA - COBRANÇA POR CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO - NATUREZA JURÍDICA DA EXAÇÃO - CRITÉRIO OBJETIVO - COMPETÊNCIA MATERIAL - JULGAMENTO AFETO AO JUÍZO DA FAZENDA PÚBLICA.


--Na prevalência do disposto no Código de Processo Civil, em seu art. 91, a competência em razão da matéria rege-se pelas normas de organização judiciária, ressalvados apenas os casos previstos no próprio CPC.


-O Código de Divisão e Organização Judiciárias do Estado de Santa Catarina dispõe que as Varas da Fazenda são competentes para julgamento das matérias atinentes a tributos e, também, das causas em que as fazendas estadual ou municipal e as autarquias estaduais ou municipais forem interessadas, como autoras ou rés, assistentes ou opoentes, e as que forem dependentes, preventivas ou assecuratórias (Art. 99, CDOJESC).


-Desta feita, verifica-se que tanto pela matéria objeto da lide, como pela pessoa litigante, qual seja, a concessionária de serviço público, a competência fixa-se na Vara da Fazenda suscitante- (Conflito de Competência n. 2005.041490-5, de Joinville, rel. Des. Volnei Carlin)-.


Esse precedente é também citado nos acórdãos dos Conflitos de Competência n. 2005.041483-6 e 2005.041481-9, ambos de Joinville, da lavra do eminente Des. Vanderlei Romer, datados de 11.05.2006, dando conta de que a 1ª Câmara de Direito Público persiste no entendimento de que é da novel Vara da Fazenda Pública da Comarca de Joinville a competência para processar e julgar o feito. 
A Terceira Câmara de Direito Público, por sua vez, no Conflito de Competência n. 2005.041488-8, também de Joinville, por acórdão da lavra do insigne Relator, Des. Rui Fortes, decidiu, por votação unânime, não conhecer do conflito e determinar sua remessa à Seção Civil, não obstante a matéria relacionada com preço público encontrar-se afeta única e exclusivamente às Câmaras de Direito Público integrantes do Grupo de Câmaras de Direito Público, em face do que dispõe o art. 3º, do Ato Regimental n. 41/00, com a redação dada pelo Ato Regimental n. 50/02 e a reestruturação determinada pelo Ato Regimental n. 57/02, independentemente de qual a Vara competente em 1º Grau:


-CONFLITO DE COMPETÊNCIA - DIVERGÊNCIA ENTRE JUIZ DE DIREITO DA VARA DA FAZENDA PÚBLICA E JUIZ DE DIREITO DA VARA CÍVEL - COMPETÊNCIA DA SEÇÃO CIVIL - PRECEDENTES - CONFLITO NÃO CONHECIDO.


-Consoante precedentes desta egrégia Corte, compete à Seção Civil processar e julgar conflito de competência suscitado por Juiz de Direito da Vara da Fazenda Pública contra Juiz de Direito da Vara Cível-.


Assim, instaurada a divergência entre as Câmaras de Direito Público, aliado ao fato de que inúmeras outras ações versando sobre a mesma matéria foram ajuizadas pela ENGEPASA AMBIENTAL LTDA., o que poderá dar origem a novos conflitos de competência, se está diante de relevante questão de direito, razão pela qual é imperativo que se suspenda o julgamento do presente conflito de competência e, nos termos do dispõe o art. 555, § 1º, do Código de Processo Civil, com a redação dada pela Lei n. 10.352/01, se instaure o incidente de prevenção ou composição de divergências e orientação jurisprudencial para os julgamentos futuros.


Dispõe o art. 555, § 1º, do Código de Processo Civil:


-§ 1.º Ocorrendo relevante questão de direito, que faça conveniente prevenir ou compor divergência entre câmaras ou turmas do tribunal, poderá o relator propor seja o recurso julgado pelo órgão colegiado que o regimento indicar; reconhecendo o interesse público na assunção de competência, esse órgão colegiado julgará o recurso-.


Pelo exposto, suspende-se o julgamento do presente conflito de competência e, diante da relevante questão de direito, submete-se a matéria ao Grupo de Câmaras de Direito Público, a teor do que dispõe o art. 555, parágrafo único, do CPC.


III - DECISÃO:

Nos termos do voto do relator, por votação unânime, a Câmara suspendeu o julgamento e submeteu a matéria ao Grupo de Câmaras de Direito Público.


Participaram do julgamento os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Cid Goulart e Newton Janke.


Pela douta Procuradoria-Geral de Justiça lavrou parecer o Exmo. Sr. Dr. Paulo Roberto de Carvalho Roberge.


Florianópolis, 18 de julho de 2006.


Cid Goulart
PRESIDENTE
Jaime Ramos
RELATOR